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sexta-feira, 14 de junho de 2013
Biografia de Agostinho de Hipona
Agostinho de Hipona
Possivelmente você pode estar pensando o seguinte: Agostinho não era um “santo católico”?
Nos vamos estudar a vida de santos agora? Não. Fique tranqüilo. Porém, há que se perceber que, antes de Lutero afixar as 95 teses contra a venda de indulgências, muita gente morreu por não aceitar os erros da Igreja Católica Apostólica Romana.
Agostinho não morreu martirizado, porém, desenvolveu a Doutrina da Graça de modo tão Bíblico que Calvino o abraçou.
Sendo assim, vamos estudar a vida deste servo de Deus e, como os reformadores fizeram, aproveitar de seus ensinos o que tem respaldo bíblico.
A origem
Agostinho nasceu em 13 de novembro de 354, em Tagasta, na África (hoje Argélia) e faleceu em 28 de agosto de 430 em Hipona. Foi um dos maiores pensadores da Igreja. Era filho de Patrício, homem de recursos, pagão, mundano, mas que se converteu nos últimos anos de sua vida e de Mônica, cristã que sempre manteve esperanças em relação ao filho, embora Agostinho tenha vivido sensual e desregradamente até os 32 anos, quando ocorreu sua conversão. Fez os estudos secundários em Madauro e estudou retórica em Cartago. Agostinho foi um aluno brilhante e capaz em Literatura, línguas e retórica (a arte do bem falar). Aos 17 anos ingressou na fase da imoralidade, teve uma amante, e com ela um filho chamado Deodato. Foi muito imoral e mulherengo. Nesta época, ao orar dizia: “Senhor dá- me continência e castidade, mas não hoje”.
A busca pelo conhecimento
A leitura do Hortensius, de Cícero, o despertou para a filosofia. Por esta época aderiu ao Maniqueísmo, do qual falaremos adiante. Em 383, desiludido com o Maniqueísmo, aproximou-se temporariamente do Ceticismo. Depois de ter ensinado retórica em Cartago e Roma, em 384 foi nomeado professor em Milão, onde, entrou em contato com Ambrósio, bispo desta cidade.
A conversão
Conta-se que, certo dia, no final do verão de 386, num jardim, numa casa de campo em Milão, na Itália, se encontrava Agostinho assentado num barco. Ao seu lado estava um exemplar das epístolas de Paulo. Mas, ele parecia não estar interessado, pois experimentava uma intensa luta espiritual, uma violenta agitação de coração e mente. Levantando-se do banco, foi para baixo de uma figueira. Ali ouviu a voz de uma criança que dizia “toma e lê, toma e lê”. Quando voltou ao banco e abriu a Bíblia, encontrou a passagem de Rm 13.14,15 . Leu e se converteu ao Cristianismo.
Em 387 foi batizado por Ambrósio e , na volta para Tagasta, perdeu sua mãe, Mônica. Este fato lhe causou grande tristeza.
Renunciou, então, a todos os prazeres, depois de grande luta interior, e retirou-se para Cassiaciacum, perto de Milão, para meditar.
Atraído pelo ideal de recolhimento e ascese, resolveu fundar um Mosteiro em Tagasta. De sua cidade natal dirigiu-se para Hipona, no inicio de 391, onde foi ordenado sacerdote, e quatro anos mais tarde, bispo-coadjutor, passando a titular com a morte do bispo diocesano Valério.
Mesmo assim, não abriu mão do ideal de vida monástica, fundado nas dependências de sua catedral uma comunidade que foi modelo para muitas outras e um centro de irradiação religiosa.
O mundo em que viveu
Agostinho viveu num momento crucial da história- a decadência do Império Romano e o fim da Antiguidade Clássica. A poderosa estrutura que, durantes séculos, dominou o mundo, desabou pela desintegração do proletariado interno e pelo ataque externo das tribos bárbaras.
Em 410 foi testemunha da tomada de Roma pelos visigodos de Alarico. E, ao morrer, em 430, presenciou o sitio de Hipona por Gensérico, rei dos vândalos, e a destruição do poderio romano na África do norte. Foi nesse mundo convulsionado por lutas internas que Agostinho exerceu o magistério sacerdotal e escreveu sua obra, de tão decisiva importância na história do pensamento cristão.
O pensamento
Escreveu contra os maniqueus, defendeu as autoridades das escrituras, explicou sobre a criação, abordou a origem do mal, debateu sobre a questão do livre-arbítrio, quando então, se tornou um grande defensor da predestinação.
A maior de suas lutas foi contra o pelagianismo; estes negavam o pecado original e aceitavam o livre-arbítrio afirmando que o homem tem o poder de vencer o pecado. Afirmavam que o homem podia pecar ou não pecar, logo, tinha vontade livre. Agostinho por sua própria experiência, percebeu o erro disso.
As obras
Além dos inúmeros sermões e cartas, das volumosas interpretações da Bíblia, além de obras didáticas, de catequese e de polemicas contra várias heresias de seu tempo (maniqueísmo, donatismo, pelagianismo), deve-se mencionar, entre as mais importantes de Agostinho:
As confissões de Agostinho (400), uma autobiografia espiritual em que faz ato de penitência e celebra a glória de Deus; relata nela sua piedade; “Tu nos fizeste para ti e nosso coração está inquieto enquanto não encontrar em ti descanso”.
De Trinitate (400-416), um tratado filosófico e teológico;
Civitas Dei ou cidade de Deus (413-426), uma justificação de fé cristã e teologia histórica, da qual é considerado o fundador. É uma síntese do pensamento filosófico – teológico e político de Agostinho. É considerada pelos críticos como uma filosofia racional da história.
Escreveu-a quando os bárbaros invadiam e Europa e Roma estava sitiada pelos infiéis.
Posições de Agostinho
Agostinho defendeu a imutabilidade de Deus, o princípio da livre criação, isto é, Deus não criou nada por imposição. Sustentou também, ao contrario dos que criam os maniqueístas, que o diabo não era igual em força de Deus. Deus é o único criador, e superior a qualquer força contraria.
Agostinho combateu com grande capacidade as heresias de seu tempo e exerceu decisiva influência sobre o desenvolvimento cultural do mundo ocidental. É chamado de “Doutor da Graça”, pois, como ninguém, soube compreender os seus efeitos. Na sua grande obra “cidade de Deus”, que gastou 13 anos para escrever, afirma: “Dois amores fundaram, pois, duas cidades, a saber: o amor próprio, levado ao desprezo de si próprio, a celestial”.
Isto resume a sua obra.Como disse alguém, “seu símbolo é um coração”. Em chamas e o olhar voltado para as alturas”.
Agostinho foi um pregador incansável (400 sermões autênticos).Grande estudioso e teólogo, seu pensamento estava centrado em dois pontos essenciais: Deus e destino do homem.
Conclusão
Agostinho foi exemplo de alguém que saiu de uma vida confusa e desregrada, para uma vida de total consagração a Deus. O texto de Romanos 13.13,14, transformou sua vida cheia de pecados e se revestiu de Cristo, na alimentando a carne. Que essa consagração sirva de exemplo para nós.
Autor: Sérgio Paulo de Lima,
Fonte: Revista Palavra Viva - Boas-Novas de Alegria, Editora Cultura Cristã.
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John Huss - Semente da Reforma
Introdução:
Dizem que política, futebol e religião são temas que “não se discutem”, depende da opinião de cada um, afinal, “cada cabeça, uma sentença”. As pessoas preferem acreditar em muitas “verdades” do que numa verdade absoluta. Dessa forma, o conceito de “certo” e “errado” vai desaparecendo da sociedade. Contrapondo-se a este ensino temos as palavras de Jesus “... a tua palavra é a verdade” (Jo 17.17). E foi a essa Verdade a que John Huss se submeteu. Em sua época, havia uma “verdade” oficial e inquestionável – a verdade da Igreja Católica Apostólica Romana. No entanto, John Huss, conhecendo a legítima Verdade não se calou e fez com que muitos homens e mulheres tivessem acesso à verdadeira libertação dada por Jesus.
1. Um Homem Comum, Mas Sonhador
A.Infância Pobre
John Huss (1369-1415) foi um homem de origem simples. Nasceu no vilarejo de Hussinecz, sul da Boêmia. Seus pais eram camponeses. Sua mãe, muito religiosa, quis que o filho fosse sacerdote. Mais tarde, Huss admitiu ter iniciado a carreira religiosa pelo dinheiro e prestígio que ela dava, mas seu interesse por Deus veio quando ele começou a estudar mais profundamente.
B. Aluno Médio
Huss não foi um aluno brilhante, mas parecia determinado a estudar e crescer. Assim, formou-se na universidade, tornou-se Mestre e dirigente da Capela de Belém, em Praga, cidade importante em seu país. Nesta Igreja, Huss pregava na língua do povo. Nas outras, o serviço religioso era feito em latim.
C. Pastor Preocupado
Huss foi um pastor dedicado. Sua preocupação era agradar a Deus com uma vida santa e prover sólida alimentação espiritual ao povo. Criticava duramente os líderes da Igreja por usarem seus ofícios em benefício próprio, vivendo no conforto e na imoralidade. Para Huss, a autoridade de um líder religioso vinha do seu caráter e não da sua posição.
Huss insistia que o povo deveria viver em total dependência de Deus, numa vida simples e consagrada ao trabalho.
Deus sempre levanta homens simples que sonham em ver a verdade de Deus como luz e guia dos homens. Muitos jovens, homens e mulheres de hoje buscam realizar seu sonho pessoal ou projeto de vida, mas poucos estão dispostos a abraçar o projeto de Deus e lutar contra o erro e o engano. É sobre isso que tratamos no próximo ponto.
2. Um Homem que Enfrentou a Oposição em Nome da Verdade
A. Deus Agindo na História
Deus é soberano. Ele é Senhor da história. Age na história e a dirige segundo a sua vontade. Aquele filho de camponeses foi ferramenta importante. Pela providencia de Deus, Huss fora colocado como o dirigente da Capela de Belém, na importante cidade de praga. A rainha Zofie costumava freqüentar aquela igreja. Ela era esposa do rei Václav da Boêmia. Zofie influenciou o rei para que facilitasse as reformas pretendidas por Huss. Com isso, a reforma cresceu, tendo Huss como líder e o Rei como escudo contra as investidas do papa.
B. Coragem para Estabelecer a Verdade
Apesar da cobertura do Rei, surge no cenário o Arcebispo de praga, chamado Zbynek, um ex-militar e agora superior de Huss. Um estrategista, que usou de sus recursos financeiros e políticos para obter este poderoso cargo no arcebispo de Praga. Zbynek não teve qualquer preparo teológico ou formação eclesiástica. A missão dele era a de erradicar a heresias de Wycliff naquela região e com isso ganhar favores do papa. Zbynek tornou-se grande inimigo da causa reformista de Huss.
C. Radicalismo ou Fidelidade a Deus?
Huss, influenciado pelos escritores de John Wycliff, tornava-se cada vez mais um apaixonado pela reforma da Igreja de Jesus Cristo. Começa então a andar em terreno perigoso. Em 1405 declara que a suposta aparição do sangue de Cristo nos elementos da comunhão não passava de embuste. Em seus sermões, condenava o pecado dos padres, bispos e arcebispos. Declarava que os crentes tinham o mesmo direito que os sacerdotes de participarem do cálice na ceia, e não somente do pão. Ridicularizava o pretenso poder dos sacerdotes de concederem o Espírito Santo a uma pessoa ou mandarem-na para o inferno.
Foram muitas e duras as críticas expostas por Huss do púlpito de sua igreja e da tinha de sua pena. Huss via a Igreja de Cristo em uma situação de clamidade e não pôde se conter diante de tantas irregularidades.
Conseqüentemente a liderança da Igreja começou a reagir. Zbynek ficou enfurecido ao saber que muitos pregadores, seguidores de Huss, acusavam Zbynek de simonia (venda de milagres) e imoralidade. Zbynek resolveu calá-los prendendo-os. Entretanto, Huss respondeu: “ Como pode haver sacerdotes imorais e criminosos andando pelas ruas livremente, enquanto que os humildes homens de Deus estão enjaulados como hereges e sofrendo privações por causa da proclamação do Evangelho ?”¹
O arcebispo Zbynek passou a enviar espias à igreja de Huss para ouvirem seus sermões. Huss sabia disso, mas não se intimidava.
Com a força do Espírito de Deus Huss tornou-se um gigante em plena Idade Média. Huss enfrentou o poder corrupto dentro de sua própria igreja e não temeu. Seu única temor era reservado àquele que é Senhor da Igreja e da História. Ao constatarmos isso podemos perceber quão omissos somos nós hoje!. Diante de corrupção, da violência e injustiça que verificamos em nossos dias, a coragem e audácia de John Huss não deveria nos mover em favor do reino de Deus?
3.Um Homem que Perdeu a Batalha, Não a Guerra
A.Uma Cilada para John Huss
Huss recebeu ordens do próprio papa para se cala, mas não se calou. Em 1412, o papa João XXIII proclamou uma cruzada contra o rei Nápoles, que tornara-se rebelde. Para levantar fundos contra a guerra, o papa institui a venda de indulgências (perdão) em larga escala por todo o império. Huss ficou horrorizado com isso e declarou: “mesmo que o fogo para queimar o meu corpo seja colocado diante dos meus olhos, eu não obedecerei”. E ainda, diante de grande pressão, declarou: “Ficarei em silêncio? Deus não permita! Ai de mim, se me calar. É melhor morrer, do que não me opor diante desta impiedade, o que me faria participante da culpa e do inferno.” Excomungado já quatro vezes, Huss resolveu exilar-se voluntariamente, para que sua igreja não privada das ministrações. Foi para o sul da Boêmia, onde escreveu livro e pregou em alguns vilarejos. Dois anos depois, o papa convocou um concílio em Constança e convidou Huss. Depois de receber garantias do imperador da Boêmia, Sigismund, meio irmão do rei Václav, que prometeu conceder-lhe salvo conduto enquanto estivesse em Constança, Huss aceitou o convite. Na segunda semana que estava em Constança, Huss foi preso e ficou nesta condição vários meses enquanto o Concílio prosseguia.
B. Uma Triste Ironia
Huss sofria amargamente numa prisão onde hoje se encontra um luxuoso hotel. As condições na sela eram tão precárias que Huss ficou seriamente enfermo e quase morreu. Nenhuma oportunidade de defesa lhe foi dada.
C. A Morte de Huss
Finalmente Huss foi chamado ao Concílio. Advertiram: “Reconsidere seus escritos, ou morre”. Huss não voltou atrás. Então, rasgaram suas vestes e colocaram em sua cabeça uma mitra de papel com 3 demônios desenhados e escrito “Eis um herege”. Acompanhado por uma multidão, Huss, amarrado e puxado pela ruas de Constança foi ao local de sua morte.
Na presença de homens, mulheres, velhos e crianças, Huss foi amarrado numa estaca e lhe deram mais um oportunidade para rever seu ensino. Mas em um grito respondeu: “Deus é minha testemunha de que a principal intenção foi tão somente libertar os homens de seus pecados e baseado na verdade do Evangelho que preguei e ensineu, estou realmente feliz em morrer hoje.” Com estas palavras um sinal foi dado ao executor que acendeu a fogueira. Por entre chamas e fumaças Huss entoou uma melodia “Jesus, Filho do Deus vivo, tem misericórdia de mim.” Huss morreu cantando.
Huss enfrentou pressões terríveis. Poderia viver uma vida confortável, desfrutando de seu status de mestre e líder religioso, mas, com Moisés, “preferiu ser maltratado... a usufruir os prazeres transitórios de pecado; porquanto considerou o opróbrio de Cristo por maiores riquezas do que os tesouros do Egito, porque contemplava o galardão” (Hb 11.25,26).
Conclusão
Apesar de morto, John Huss não foi derrotado. Deixou um legado para a causa da Reforma Protestante que surgiria décadas depois, com Martinho Lutero. Tanto Wycliff como Huss foram sementes semeadas a seu tempo, que brotaram anos mais tarde, cujos frutos colhemos ainda hoje.
Que possamos, como verdadeiros cristão, defender a verdade do Evangelho e, se preciso for, assim como John Huss, morrer por ela.
Nota
¹ Revista Church History, p. 13.
Autor: Dráusio Piratininga Gonçalves
Fonte: revista Palavra Viva – Graça e Fé, pg 9-12, Editora Cultura Cristã.
www.facebook.com/paposteologicos
Introdução:
Dizem que política, futebol e religião são temas que “não se discutem”, depende da opinião de cada um, afinal, “cada cabeça, uma sentença”. As pessoas preferem acreditar em muitas “verdades” do que numa verdade absoluta. Dessa forma, o conceito de “certo” e “errado” vai desaparecendo da sociedade. Contrapondo-se a este ensino temos as palavras de Jesus “... a tua palavra é a verdade” (Jo 17.17). E foi a essa Verdade a que John Huss se submeteu. Em sua época, havia uma “verdade” oficial e inquestionável – a verdade da Igreja Católica Apostólica Romana. No entanto, John Huss, conhecendo a legítima Verdade não se calou e fez com que muitos homens e mulheres tivessem acesso à verdadeira libertação dada por Jesus.
1. Um Homem Comum, Mas Sonhador
A.Infância Pobre
John Huss (1369-1415) foi um homem de origem simples. Nasceu no vilarejo de Hussinecz, sul da Boêmia. Seus pais eram camponeses. Sua mãe, muito religiosa, quis que o filho fosse sacerdote. Mais tarde, Huss admitiu ter iniciado a carreira religiosa pelo dinheiro e prestígio que ela dava, mas seu interesse por Deus veio quando ele começou a estudar mais profundamente.
B. Aluno Médio
Huss não foi um aluno brilhante, mas parecia determinado a estudar e crescer. Assim, formou-se na universidade, tornou-se Mestre e dirigente da Capela de Belém, em Praga, cidade importante em seu país. Nesta Igreja, Huss pregava na língua do povo. Nas outras, o serviço religioso era feito em latim.
C. Pastor Preocupado
Huss foi um pastor dedicado. Sua preocupação era agradar a Deus com uma vida santa e prover sólida alimentação espiritual ao povo. Criticava duramente os líderes da Igreja por usarem seus ofícios em benefício próprio, vivendo no conforto e na imoralidade. Para Huss, a autoridade de um líder religioso vinha do seu caráter e não da sua posição.
Huss insistia que o povo deveria viver em total dependência de Deus, numa vida simples e consagrada ao trabalho.
Deus sempre levanta homens simples que sonham em ver a verdade de Deus como luz e guia dos homens. Muitos jovens, homens e mulheres de hoje buscam realizar seu sonho pessoal ou projeto de vida, mas poucos estão dispostos a abraçar o projeto de Deus e lutar contra o erro e o engano. É sobre isso que tratamos no próximo ponto.
2. Um Homem que Enfrentou a Oposição em Nome da Verdade
A. Deus Agindo na História
Deus é soberano. Ele é Senhor da história. Age na história e a dirige segundo a sua vontade. Aquele filho de camponeses foi ferramenta importante. Pela providencia de Deus, Huss fora colocado como o dirigente da Capela de Belém, na importante cidade de praga. A rainha Zofie costumava freqüentar aquela igreja. Ela era esposa do rei Václav da Boêmia. Zofie influenciou o rei para que facilitasse as reformas pretendidas por Huss. Com isso, a reforma cresceu, tendo Huss como líder e o Rei como escudo contra as investidas do papa.
B. Coragem para Estabelecer a Verdade
Apesar da cobertura do Rei, surge no cenário o Arcebispo de praga, chamado Zbynek, um ex-militar e agora superior de Huss. Um estrategista, que usou de sus recursos financeiros e políticos para obter este poderoso cargo no arcebispo de Praga. Zbynek não teve qualquer preparo teológico ou formação eclesiástica. A missão dele era a de erradicar a heresias de Wycliff naquela região e com isso ganhar favores do papa. Zbynek tornou-se grande inimigo da causa reformista de Huss.
C. Radicalismo ou Fidelidade a Deus?
Huss, influenciado pelos escritores de John Wycliff, tornava-se cada vez mais um apaixonado pela reforma da Igreja de Jesus Cristo. Começa então a andar em terreno perigoso. Em 1405 declara que a suposta aparição do sangue de Cristo nos elementos da comunhão não passava de embuste. Em seus sermões, condenava o pecado dos padres, bispos e arcebispos. Declarava que os crentes tinham o mesmo direito que os sacerdotes de participarem do cálice na ceia, e não somente do pão. Ridicularizava o pretenso poder dos sacerdotes de concederem o Espírito Santo a uma pessoa ou mandarem-na para o inferno.
Foram muitas e duras as críticas expostas por Huss do púlpito de sua igreja e da tinha de sua pena. Huss via a Igreja de Cristo em uma situação de clamidade e não pôde se conter diante de tantas irregularidades.
Conseqüentemente a liderança da Igreja começou a reagir. Zbynek ficou enfurecido ao saber que muitos pregadores, seguidores de Huss, acusavam Zbynek de simonia (venda de milagres) e imoralidade. Zbynek resolveu calá-los prendendo-os. Entretanto, Huss respondeu: “ Como pode haver sacerdotes imorais e criminosos andando pelas ruas livremente, enquanto que os humildes homens de Deus estão enjaulados como hereges e sofrendo privações por causa da proclamação do Evangelho ?”¹
O arcebispo Zbynek passou a enviar espias à igreja de Huss para ouvirem seus sermões. Huss sabia disso, mas não se intimidava.
Com a força do Espírito de Deus Huss tornou-se um gigante em plena Idade Média. Huss enfrentou o poder corrupto dentro de sua própria igreja e não temeu. Seu única temor era reservado àquele que é Senhor da Igreja e da História. Ao constatarmos isso podemos perceber quão omissos somos nós hoje!. Diante de corrupção, da violência e injustiça que verificamos em nossos dias, a coragem e audácia de John Huss não deveria nos mover em favor do reino de Deus?
3.Um Homem que Perdeu a Batalha, Não a Guerra
A.Uma Cilada para John Huss
Huss recebeu ordens do próprio papa para se cala, mas não se calou. Em 1412, o papa João XXIII proclamou uma cruzada contra o rei Nápoles, que tornara-se rebelde. Para levantar fundos contra a guerra, o papa institui a venda de indulgências (perdão) em larga escala por todo o império. Huss ficou horrorizado com isso e declarou: “mesmo que o fogo para queimar o meu corpo seja colocado diante dos meus olhos, eu não obedecerei”. E ainda, diante de grande pressão, declarou: “Ficarei em silêncio? Deus não permita! Ai de mim, se me calar. É melhor morrer, do que não me opor diante desta impiedade, o que me faria participante da culpa e do inferno.” Excomungado já quatro vezes, Huss resolveu exilar-se voluntariamente, para que sua igreja não privada das ministrações. Foi para o sul da Boêmia, onde escreveu livro e pregou em alguns vilarejos. Dois anos depois, o papa convocou um concílio em Constança e convidou Huss. Depois de receber garantias do imperador da Boêmia, Sigismund, meio irmão do rei Václav, que prometeu conceder-lhe salvo conduto enquanto estivesse em Constança, Huss aceitou o convite. Na segunda semana que estava em Constança, Huss foi preso e ficou nesta condição vários meses enquanto o Concílio prosseguia.
B. Uma Triste Ironia
Huss sofria amargamente numa prisão onde hoje se encontra um luxuoso hotel. As condições na sela eram tão precárias que Huss ficou seriamente enfermo e quase morreu. Nenhuma oportunidade de defesa lhe foi dada.
C. A Morte de Huss
Finalmente Huss foi chamado ao Concílio. Advertiram: “Reconsidere seus escritos, ou morre”. Huss não voltou atrás. Então, rasgaram suas vestes e colocaram em sua cabeça uma mitra de papel com 3 demônios desenhados e escrito “Eis um herege”. Acompanhado por uma multidão, Huss, amarrado e puxado pela ruas de Constança foi ao local de sua morte.
Na presença de homens, mulheres, velhos e crianças, Huss foi amarrado numa estaca e lhe deram mais um oportunidade para rever seu ensino. Mas em um grito respondeu: “Deus é minha testemunha de que a principal intenção foi tão somente libertar os homens de seus pecados e baseado na verdade do Evangelho que preguei e ensineu, estou realmente feliz em morrer hoje.” Com estas palavras um sinal foi dado ao executor que acendeu a fogueira. Por entre chamas e fumaças Huss entoou uma melodia “Jesus, Filho do Deus vivo, tem misericórdia de mim.” Huss morreu cantando.
Huss enfrentou pressões terríveis. Poderia viver uma vida confortável, desfrutando de seu status de mestre e líder religioso, mas, com Moisés, “preferiu ser maltratado... a usufruir os prazeres transitórios de pecado; porquanto considerou o opróbrio de Cristo por maiores riquezas do que os tesouros do Egito, porque contemplava o galardão” (Hb 11.25,26).
Conclusão
Apesar de morto, John Huss não foi derrotado. Deixou um legado para a causa da Reforma Protestante que surgiria décadas depois, com Martinho Lutero. Tanto Wycliff como Huss foram sementes semeadas a seu tempo, que brotaram anos mais tarde, cujos frutos colhemos ainda hoje.
Que possamos, como verdadeiros cristão, defender a verdade do Evangelho e, se preciso for, assim como John Huss, morrer por ela.
Nota
¹ Revista Church History, p. 13.
Autor: Dráusio Piratininga Gonçalves
Fonte: revista Palavra Viva – Graça e Fé, pg 9-12, Editora Cultura Cristã.
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O Fruto do Espírito
Romanos 12:1-21; 1 Coríntios 12:1-14:40; Gálatas 5:19-26; Efésios 4:1-6:20
O fruto do Espírito Santo é um dos aspectos mais negligenciados do ensino bíblico sobre santificação. Há várias razões para isso:
1. A preocupação com as coisas exteriores. Embora os estudantes muitas vezes murmurem e reclamem quando têm de fazer uma prova na escola, há um sentido em que realmente queremos fazer as provas. Sempre encontramos nas revistas modelos de testes que medem habilidades, realizações ou conhecimentos. As pessoas gostam de saber em que nível estão. Será que consegui alcançar a excelência numa certa área, ou estou afundando na mediocridade?
Os cristãos não são diferentes. Tendemos a medir nosso progresso na santificação examinando nosso desempenho de acordo com padrões externos. Proferimos maldições e palavrões? Bebemos muito? Vamos muito ao cinema? Esses padrões são frequentemente usados para medir a espiritualidade. O verdadeiro teste — a evidência do fruto do Espírito Santo — geralmente é ignorado ou minimizado. Foi nessa armadilha que os fariseus caíram.
Nós nos afastamos do verdadeiro teste porque o fruto do Espírito é difícil demais. Exige muito mais do caráter pessoal do que os padrões exteriores superficiais. É muito mais fácil evitar falar um palavrão do que adquirir o hábito de ter uma paciência piedosa.
2. A preocupação com os dons. O mesmo Espírito Santo que nos guia na santidade e produz fruto em nós também distribui os dons espirituais aos crentes. Parecemos muito mais interessados nos dons do Espírito do que no fruto, a despeito do ensino claro da Bíblia de que alguém pode possuir dons e ser imaturo no progresso espiritual. A carta de Paulo aos Coríntios deixa isso muito claro.
3. O problema dos descrentes justos. É frustrante medirmos nosso progresso na santificação pelo fruto do Espírito Santo porque as virtudes relacionadas às vezes são exibidas num nível maior por descrentes. Todos nós conhecemos pessoas não-cristãs que demonstram mais bondade ou mansidão do que muitos cristãos. Se as pessoas podem ter o “fruto do Espírito” independentemente do Espírito, como podemos determinar nosso crescimento espiritual desta maneira?
Há uma diferença qualitativa entre as virtudes de amor, alegria, paz, longanimidade, etc., engendradas em nós pelo Espírito Santo e aquelas exibidas pelos descrentes. Os não- crentes operam por motivos que, em última análise, são egoístas. Quando, porém, um crente exibe o fruto do Espírito, ele está mostrando características que, em última análise, são voltadas para Deus e para o próximo. Ser cheio do Espírito Santo significa ter uma vida controlada pelo Espírito; os não-crentes só podem exibir essas virtudes espirituais no nível da capacidade humana.
Paulo faz uma lista das virtudes do fruto do Espírito em sua carta aos Gálatas: “ Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio ” (Gálatas 5:22,23). Essas virtudes caracterizam a vida cristã. Se somos cheios do Espírito, vamos exibir o fruto do Espírito. Isso, porém, obviamente envolve tempo. Não são ajuste superficiais do caráter que ocorrem da noite para o dia.
Tais mudanças envolvem uma reformulação das disposições mais íntimas do coração, o que representa um processo de longa vida de santificação pelo Espírito.
Sumário
1. Tendemos a negligenciar o estudo do fruto do Espírito Santo porque: (1) nos preocupamos mais com aspectos exteriores; (2) nos preocupamos mais com os dons espirituais e (3) reconhecemos que muitas pessoas incrédulas exibem as virtudes espirituais melhor do que os cristãos.
2. É mais fácil medir a espiritualidade por fatores exteriores do que pelo fruto do Espírito.
3. Podemos ter os dons espirituais e mesmo assim ser imaturos.
4. Existe uma diferença qualitativa entre a presença das virtudes espirituais nos incrédulos e nos crentes. Nos incrédulos, a virtude demonstra um mero esforço humano. Nos cristãos, as virtudes espirituais representam o Deus Espírito Santo produzindo um fruto espiritual numa medida além da capacidade humana.
Autor: R. C. Sproul
Fonte: 3º Caderno Verdades Essenciais da Fé Cristã – R.C.Sproul.
Editora Cultura Cristã.
Romanos 12:1-21; 1 Coríntios 12:1-14:40; Gálatas 5:19-26; Efésios 4:1-6:20
O fruto do Espírito Santo é um dos aspectos mais negligenciados do ensino bíblico sobre santificação. Há várias razões para isso:
1. A preocupação com as coisas exteriores. Embora os estudantes muitas vezes murmurem e reclamem quando têm de fazer uma prova na escola, há um sentido em que realmente queremos fazer as provas. Sempre encontramos nas revistas modelos de testes que medem habilidades, realizações ou conhecimentos. As pessoas gostam de saber em que nível estão. Será que consegui alcançar a excelência numa certa área, ou estou afundando na mediocridade?
Os cristãos não são diferentes. Tendemos a medir nosso progresso na santificação examinando nosso desempenho de acordo com padrões externos. Proferimos maldições e palavrões? Bebemos muito? Vamos muito ao cinema? Esses padrões são frequentemente usados para medir a espiritualidade. O verdadeiro teste — a evidência do fruto do Espírito Santo — geralmente é ignorado ou minimizado. Foi nessa armadilha que os fariseus caíram.
Nós nos afastamos do verdadeiro teste porque o fruto do Espírito é difícil demais. Exige muito mais do caráter pessoal do que os padrões exteriores superficiais. É muito mais fácil evitar falar um palavrão do que adquirir o hábito de ter uma paciência piedosa.
2. A preocupação com os dons. O mesmo Espírito Santo que nos guia na santidade e produz fruto em nós também distribui os dons espirituais aos crentes. Parecemos muito mais interessados nos dons do Espírito do que no fruto, a despeito do ensino claro da Bíblia de que alguém pode possuir dons e ser imaturo no progresso espiritual. A carta de Paulo aos Coríntios deixa isso muito claro.
3. O problema dos descrentes justos. É frustrante medirmos nosso progresso na santificação pelo fruto do Espírito Santo porque as virtudes relacionadas às vezes são exibidas num nível maior por descrentes. Todos nós conhecemos pessoas não-cristãs que demonstram mais bondade ou mansidão do que muitos cristãos. Se as pessoas podem ter o “fruto do Espírito” independentemente do Espírito, como podemos determinar nosso crescimento espiritual desta maneira?
Há uma diferença qualitativa entre as virtudes de amor, alegria, paz, longanimidade, etc., engendradas em nós pelo Espírito Santo e aquelas exibidas pelos descrentes. Os não- crentes operam por motivos que, em última análise, são egoístas. Quando, porém, um crente exibe o fruto do Espírito, ele está mostrando características que, em última análise, são voltadas para Deus e para o próximo. Ser cheio do Espírito Santo significa ter uma vida controlada pelo Espírito; os não-crentes só podem exibir essas virtudes espirituais no nível da capacidade humana.
Paulo faz uma lista das virtudes do fruto do Espírito em sua carta aos Gálatas: “ Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio ” (Gálatas 5:22,23). Essas virtudes caracterizam a vida cristã. Se somos cheios do Espírito, vamos exibir o fruto do Espírito. Isso, porém, obviamente envolve tempo. Não são ajuste superficiais do caráter que ocorrem da noite para o dia.
Tais mudanças envolvem uma reformulação das disposições mais íntimas do coração, o que representa um processo de longa vida de santificação pelo Espírito.
Sumário
1. Tendemos a negligenciar o estudo do fruto do Espírito Santo porque: (1) nos preocupamos mais com aspectos exteriores; (2) nos preocupamos mais com os dons espirituais e (3) reconhecemos que muitas pessoas incrédulas exibem as virtudes espirituais melhor do que os cristãos.
2. É mais fácil medir a espiritualidade por fatores exteriores do que pelo fruto do Espírito.
3. Podemos ter os dons espirituais e mesmo assim ser imaturos.
4. Existe uma diferença qualitativa entre a presença das virtudes espirituais nos incrédulos e nos crentes. Nos incrédulos, a virtude demonstra um mero esforço humano. Nos cristãos, as virtudes espirituais representam o Deus Espírito Santo produzindo um fruto espiritual numa medida além da capacidade humana.
Autor: R. C. Sproul
Fonte: 3º Caderno Verdades Essenciais da Fé Cristã – R.C.Sproul.
Editora Cultura Cristã.
terça-feira, 11 de junho de 2013
A inerrância da Escritura.
A inerrância da Escritura
1. O significado de inerrância.
A seção anterior tratou a respeito da veracidade da Escritura. Um componente importante desse tópico é a inerrância da Escritura. Essa questão é de grande importância no mundo evangélico hoje porque em muitos círculos a veracidade da Escritura tem sido questionada ou mesmo abandonada. Com a evidência dada acima a respeito da veracidade da Escritura, estamos agora na posição de definir a inerrância bíblica: A inerrância da Escritura significa que a Escritura, nos seus manuscritos originais, não afirma nada que seja contrário ao fato. Essa definição enfoca a questão da veracidade e da falsidade na linguagem da Escritura. A definição em termos simples significa apenas que a Bíblia sempre diz a verdade e que ela sempre diz a verdade a respeito de cada coisa a que se refere. Essa definição não significa que a Bíblia nos diz cada fato que há para conhecer a respeito de um assunto, mas afirma que o que ela diz a respeito de um assunto é verdadeiro. É importante perceber no começo desta discussão que o foco desta controvérsia é sobre a questão da veracidade na linguagem. Deve-se reconhecer que a veracidade absoluta na linguagem está de acordo com alguns outros tipos de afirmações, como as que se seguem:
a. A Bíblia pode ser inerrânte e ainda falar a linguagem habitual da conversação diária.
Isso é especialmente verdadeiro nas descrições de fatos ou eventos de caráter “científico” ou “histórico”. A Bíblia pode falar do sol que se levanta e da chuva que cai por causa perspectiva do narrador, que é exatamente o que acontece. Da perspectiva do narrador, o sol realmente se levanta e a chuva realmente cai, e essas são descrições perfeitamente verdadeiras dos fenômenos naturais que o narrador observa. Uma consideração similar aplica-se aos números quando usados para contar ou para medir. Um repórter pode dizer que 8000 homens foram mortos em determinada batalha sem, desse modo, sugerir que ele contou cada um e que não havia 7 999 ou 8001 soldados mortos. Isso é verdade também a respeito das medidas. Se eu digo: “Não moro longe da biblioteca”, ou “Moro a pouco mais de um quilômetro da biblioteca”, ou “Moro a um pouquinho menos de um quilômetro da biblioteca” ,ou “Moro a um quilômetro e meio da biblioteca”, todas essas afirmações possuem certo grau de proximidade e de exatidão. Em ambos os exemplos, e em muitos outros que poderiam ser retirados da vida diária, os limites da veracidade dependeriam do grau de precisão sugerido pelo narrador e esperado por seus ouvintes originais. Não haveria problema para nós, então, em afirmar que, ao mesmo tempo em que a Bíblia é absolutamente verdadeira em tudo o que diz, ela usa a linguagem comum para descrever os fenômenos naturais e dar aproximações ou números redondos quando eles são apropriados no contexto.
b. A Bíblia pode ser inerrânte e, todavia, incluir citações livres ou soltas.
O método pelo qual uma pessoa cita as palavras de outra é um procedimento que em grande parte varia de cultura para cultura. Enquanto na cultura contemporânea americana e inglesa costumamos mencionar as palavras exatas de uma pessoa fazendo citações entre aspas, o grego escrito no tempo do NT não possuía aspas ou qualquer espécie de sinalização equivalente, e a citação exata de outra pessoa precisava incluir somente a apresentação correta do conteúdo do que a pessoa havia dito (mais ou menos como o nosso uso de citações indiretas); não era esperado que cada palavra fosse citada com exatidão. Assim, a inerrância é coerente com citações livres ou soltas do AT ou das palavras de Jesus, por exemplo, contanto que o conteúdo não seja falso em relação ao que originariamente foi afirmado. O escritor original não sugeriu de forma geral que estivesse usando as palavras exatas de um narrador e somente aquelas, nem os ouvintes originais esperavam a citação textual em tal narração.
c. As construções gramaticais incomuns ou excepcionais na Bíblia não contradizem a inerrância.
Alguma coisa da linguagem na Escritura é elegante e estilisticamente excelente. Outras passagens da Escritura contêm linguagem mais própria das pessoas comuns. As vezes isso inclui a falha em seguir as regras de expressão usualmente aceitáveis (como o uso de um verbo no plural, quando as regras gramaticais exigem um verbo no singular). Essas afirmações gramaticais estilisticamente incorretas (muitas delas são encontradas no livro de Apocalipse) não devem ser problema para nós, pois elas não afetam a veracidade das afirmações em pauta; a afirmação pode não ser gramaticalmente correta e, todavia, ser totalmente verdadeira. Por exemplo, o lenhador da área rural que não possua educação formal pode ser o homem mais confiável da região, mesmo que a sua gramática seja pobre, porque ele ganhou a reputação de nunca mentir. De modo semelhante, há algumas afirmações na Escritura (nas línguas originais) que não são corretas gramaticalmente (de acordo com os padrões vigentes da boa gramática naquele tempo), mas são ainda inerrântes porque são completamente verdadeiras. Deus usou pessoas comuns que usaram o seu vocabulário comum. A questão não é a elegância de estilo, mas a veracidade no falar.
2. Alguns desafios comuns a inerrância.
Nesta seção vamos examinar algumas das objeções mais importantes que são regularmente levantadas contra o conceito de inerrância. A Bíblia é a única regra repleta de autoridade para a “fé e prática”. Uma das objeções mais freqüentes à inerrância é levantada por aqueles que dizem que o propósito da Escritura é ensinar-nos em áreas que dizem respeito à “fé e prática” somente, isto é, nas áreas que dizem respeito diretamente à nossa fé religiosa ou nossa conduta ética. Essa posição permite a possibilidade de afirmações falsas na Escritura, como, por exemplo, em outras áreas como a de detalhes históricos sem maior importância ou em fatos científicos — essas áreas, é dito, não dizem respeito ao propósito da Bíblia, que é o de nos instruir sobre em que devemos crer e como devemos viver. Os defensores dessa posição muitas vezes preferem dizer que a Bíblia é infalível, mas hesitam em usar a palavra inerrânte. A resposta a essa objeção pode ser afirmada do seguinte modo: A Bíblia repetidamente afirma que toda a Escritura é útil para nós e que tudo é “inspirado por Deus” (2Tm 3.16). Assim, ela é completamente pura (Sl 12.6), perfeita (Sl 119.96) e verdadeira (Sl 119. 160).A Bíblia não faz ela própria qualquer restrição aos assuntos sobre os quais fala com toda a verdade.
O NT contém afirmações adicionais sobre a confiabilidade de todas as partes da Escritura. Em Atos 24.14, Paulo diz que ele adora a Deus, acreditando “em tudo o que concorda com a Lei e no que está escrito nos Profetas”. Em Lucas 24.25 (RA), Jesus diz que os discípulos são “néscios” porque eram “tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram”. Em Romanos 15.4, Paulo diz que “tudo o que foi escrito no passado” no AT “foi escrito para nos ensinar”. Esses textos não dão indicação alguma de que haja qualquer parte da Escritura que não seja digna de confiança ou na qual não se possa confiar completamente. O rápido exame do detalhes históricos do AT que são citados no NT indica que os escritores do NT estavam desejosos de confiar na veracidade de qualquer parte das narrativas históricas do AT. Nenhum detalhe é tão insignificante que não possa ser usado para a instrução dos cristãos do NT (v.,por ex., Mt 12.3,4,41; Lc 4.25,26; Jo 4.5; Co 10.11; Hb 11; Hb 12.16,17; Tg 2.25; 2Pe 2.16 etc.). Não há indicação alguma de que eles pensassem que uma categoria de afirmações da Escritura não fosse confiável (por exemplo, afirmações “históricas e científicas” como opostas às passagens de caráter doutrinário ou moral). Parece claro que a Bíblia em si mesma não dá suporte a qualquer restrição com respeito a assuntos dos quais ela fala com autoridade e verdade absoluta; de fato, muitas passagens na Escritura realmente excluem a validade desta espécie de restrição. A segunda resposta aos que limitam a veracidade necessária da Escritura a matérias de “fé e prática” é que o pensamento deles confunde o propósito principal da Escritura com o propósito total dela. Dizer que o propósito principal da Escritura é ensinar-nos em matéria de “fé e prática” é fazer um sumário útil e correto do propósito de Deus em nos dar a Bíblia. Mas, como sumário, ele inclui somente o propósito mais proeminente de Deus ao nos dar a Escritura. Não é, contudo, legítimo usar esse sumário para negar que é parte do propósito da Escritura discorrer a respeito de detalhes históricos menos importantes ou a respeito de alguns aspectos de astronomia ou geografia, e assim por diante. Um sumário não pode ser devidamente usado para negar uma das coisas que ele está sintetizando! É melhor dizer que o propósito total da Escritura é dizer tudo o que ela diz, qualquer que seja o assunto. Cada uma das palavras de Deus na Escritura foi considerada por ele como importante para nós. Assim, Deus emite severas advertências a qualquer um que retire mesmo uma só palavra do que ele nos disse (Dt 4.2; 12.32; Ap 22.18,19). Não podemos acrescentar nada às palavras de Deus ou retirar algo delas, porque todas são parte do propósito mais amplo que ele nos quis comunicar. Cada coisa afirmada na Escritura está ali porque Deus quis que estivesse. Deus não diz nada sem propósito!
O termo inerrância é um termo pobre.
As pessoas que fazem essa segunda objeção dizem que o termo inerrância é preciso demais e que no uso comum denota uma espécie de precisão científica absoluta que não queremos reivindicar para a Escritura. Além disso, os que levantam essa objeção observam que o termo inerrância não é usado na própria Bíblia. Portanto, eles dizem, provavelmente não é o termo apropriado sobre o qual devamos insistir. A resposta a essa objeção pode ser feita do seguinte modo: Primeiro, a palavra tem sido usada por estudiosos há mais de cem anos, e eles sempre têm atentado para “limitações” que fazem parte de uma narrativa na linguagem comum. Ademais, deve ser observado que muitas vezes usamos termos não bíblicos para resumir um ensino bíblico. A palavra Trindade não ocorre na Escritura, nem a palavra encarnação. Todavia, ambos os termos são muito úteis porque nos permitem sintetizar em uma palavra um conceito bíblico verdadeiro e são, portanto, úteis para capacitar-nos a discutir um ensino bíblico mais facilmente. Finalmente, hoje na igreja parece que somos incapazes de levar a discussão adiante nessa matéria sem o uso do termo. As pessoas podem objetar a termos, se quiserem, mas, gostando ou não, esse é o termo em torno do qual a discussão tem-se desenvolvido e quase certamente continuará a sê-lo nas próximas décadas. Portanto, parece apropriado manter seu uso na discussão a respeito da veracidade completa da Escritura.
Não possuímos nenhum manuscrito inerrânte. Portanto, falar a respeito de inerrância é um engano. Os que fazem essa objeção apontam para o fato de que a inerrância sempre tem sido reivindicada para o documento original ou para as cópias originais dos documentos bíblicos. Todavia, nenhuma delas sobrevive; temos somente cópias de cópias do que Moisés, Paulo ou Pedro escreveram. Qual é, então, a razão de se atribuir tanta importância à doutrina que se aplica somente aos manuscritos que ninguém possui? Em resposta a essa objeção, podemos primeiro pensar em uma analogia da história americana. A cópia original da Constituição dos Estados Unidos está guardada no edifício chamado National Archives, em Washington, DC. Se por causa de um terrível evento o edifício for destruído e a cópia original da Constituição se perder, poderíamos saber o que a Constituição dizia? Claro que sim! Nós compararíamos suas centenas de cópias e, onde todas concordassem, teríamos razão para crer que temos as palavras exatas do documento original. Processo semelhante ocorreu na determinação das palavras originais da Bíblia. Pois, em cerca de 99% das palavras da Bíblia, nós sabemos o que o manuscrito original dizia. Mesmo que em muitos versículos haja variantes textuais (isto é, palavras diferentes em diferentes cópias antigas do mesmo versículo), a decisão correta é com freqüência bastante clara (pode haver um óbvio erro de copista, por exemplo), e há realmente pouquíssimos lugares onde a variante textual seja ao mesmo tempo difícil de avaliar e relevante para a determinação do sentido do texto. Em porcentagem pequena de casos em que há incerteza significativa a respeito do que o texto original dizia, o sentido geral da frase em geral é suficientemente claro por causa do contexto. Isso não significa que o estudo das variantes textuais não seja importante, mas significa que o estudo das variantes textuais não nos deixa confusos a respeito do que os manuscritos originais disseram. Ao contrário, esse estudo nos aproxima do conteúdo dos manuscritos originais. Porque, para a maior parte dos propósitos práticos, os textos especializados presentemente publicados do hebraico do AT e do grego do NT são como se fossem os manuscritos originais. Portanto, a doutrina da inerrância afeta como pensamos não somente a respeito dos manuscritos originais, mas também a respeito dos manuscritos atuais.
Os autores bíblicos “acomodaram” suas mensagens nos detalhes menos importantes às falsas idéias correntes em seu tempo e afirmaram ou ensinaram essas idéias de modo incidental. Os que sustentam essa posição argumentam que teria sido muito difícil para os escritores bíblicos comunicar-se com o povo de seu tempo se tivessem tentado corrigir toda a falsa informação histórica e científica aceita por seus contemporâneos (como o universo de três andares ou que nosso planeta é uma espécie de prato plano, e assim por diante). Portanto, dizem, quando os autores da Escritura estavam tentando propor um argumento mais amplo, algumas vezes incidentalmente fizeram certas afirmações falsas aceitas pelas pessoas de sua época. A essa objeção à inerrância podemos responder que Deus é o Senhor da linguagem que pode usar a linguagem humana para comunicar-se perfeitamente sem ter de afirmar quaisquer idéias falsas que possam ter sido sustentadas pelas pessoas contemporâneas aos autores da Escritura. Além disso, tal “acomodação” de Deus ao nosso entendimento errôneo implicaria que Deus agiu contrariamente ao seu caráter de um Deus que não pode mentir (Nm 23.19; Tt 1.2; Hb 6.18). Embora Deus se rebaixe a falar a língua dos seres humanos, nenhuma passagem da Escritura ensina que ele seja ‘‘condescendente’’a ponto de agir de modo contrário ao seu caráter moral. Essa objeção, assim, em sua raiz, interpreta mal a pureza e a unidade de Deus na medida em que elas afetam todas as suas palavras e os seus atos.
Há alguns erros claros na Bíblia.
Para muitos que negam a inerrância, a convicção de que há alguns erros evidentes na Escritura é o fator de maior importância que os persuade a desafiar a doutrina da inerrância. Em cada caso, contudo, a primeira resposta que deveria ser dada a essa objeção é perguntar onde os erros estão, ou em qual versículo específico ou versículos esses “erros” ocorrem. É surpreendente ver quantas vezes essa objeção é levantada por pessoas que têm pouca ou nenhuma idéia sobre onde os erros específicos estão. Todavia crêem que há erros porque outros disseram que há. Em outros casos, contudo, alguns mencionam uma ou mais passagens específicas onde, segundo alegam, há uma afirmação falsa na Escritura. Em muitos exemplos, o exame cuidadoso do texto bíblico em si trará à luz uma ou mais soluções possíveis para a dificuldade alegada. Em poucas passagens, nenhuma solução para a dificuldade pode ficar imediatamente evidente da leitura do texto em nossa língua. A essa altura é útil consultar alguns comentários sobre o texto. Há uns poucos textos em que certo conhecimento do hebraico ou grego talvez seja necessário a fim de se encontrar a solução, e quem que não possui acesso de primeira mão a essas línguas terá de encontrar respostas em um comentário mais técnico ou servir-se de alguém que possua treinamento para isso. Naturalmente, o nosso entendimento da Escritura nunca é perfeito, e isso significa que pode haver casos em que não seremos capazes de encontrar solução para uma passagem difícil no presente momento. Isso é assim porque a evidência lingüística, histórica ou contextual de que precisamos para entender a passagem corretamente ainda é desconhecida para nós. Essa dificuldade em pequeno número de passagens não deve incomodar-nos, desde que o padrão total de nossa investigação dessas passagens mostre que não há, de fato, nenhum dos erros alegados.
Finalmente, a perspectiva histórica sobre essa questão é útil. Não há realmente quaisquer problemas “novos” na Escritura. A Bíblia em sua totalidade tem mais de dezenove séculos, e os pretensos “textos-problema” estavam ali o tempo todo. Todavia, no decorrer de toda a história da igreja há a firme crença na inerrância das Escrituras no sentido em que ela foi definida neste capítulo. Além disso, há centenas de anos estudiosos muito competentes da Bíblia lêem e estudam esses textos-problema e ainda não encontraram dificuldade em sustentar a inerrância. Isso deveria deixar-nos confiantes em que as soluções para esses problemas estão disponíveis e em que a crença na inerrância está totalmente de acordo com a duradoura atenção dedicada ao texto da Escritura.
3. Problemas com a negação da inerrância.
Os problemas que aparecem com a negação da inerrância bíblica são muito significativos e, quando entendemos a magnitude desses problemas, isso nos dá o encorajamento adicional não somente para afirmar a inerrância, mas também para garantir sua importância para a igreja. Alguns dos problemas mais sérios são os listados a seguir:
a. Se negarmos a inerrância, deparamos com um sério problema moral: Podemos imitar Deus e intencionalmente mentir nas pequenas coisas também? Efésios 5.1 nos diz que sejamos imitadores de Deus. Mas a negação de inerrância que ainda alega que as palavras da Escritura são palavras sopradas por Deus necessariamente leva à conclusão de que Deus intencionalmente falou falsamente para nós em algumas das afirmações menos centrais da Escritura. Mas, se para Deus é correto agir assim, como pode ser errado para nós? Tal linha de raciocínio, se crêssemos nela, exerceria grande pressão sobre nós para que começássemos a falar inverdades em situações onde poderiam parecer de ajuda em nossa comunicação, e assim por diante. Essa posição seria uma ladeira escorregadia com resultados negativos sempre crescentes em nossa vida.
b. Segundo, se a inerrância é negada, começamos a pensar se realmente podemos confiar em Deus em qualquer coisa que ele venha a dizer.
Uma vez que nos convençamos de que Deus nos falou de maneira falsa em alguns assuntos de menor importância na Escritura, percebemos que Deus é capaz de nos falar falsamente. Isso ocasionará um efeito prejudicial sério sobre a nossa capacidade de levar Deus a sério em sua palavra e confiar nele completamente ou obedecer a ele plenamente no restante da Escritura. Podemos começar a desobedecer inicialmente nas seções da Escritura que menos desejaríamos obedecer, e desconfiar inicialmente das seções nas quais estaríamos menos inclinados a confiar. Mas tal procedimento finalmente se expandirá, para grande prejuízo de nossa vida espiritual.
c. Terceiro, se negarmos a inerrância, essencialmente faremos da mente o padrão de verdade mais alto que a própria Palavra de Deus.
Usamos nossa mente para estabelecer juízo sobre algumas partes da Palavra de Deus e as pronunciamos como contendo erros. Mas isso é, de fato, dizer que conhecemos a verdade com mais certeza e mais exatidão que a própria Palavra de Deus (ou que Deus), ao menos nessas áreas. Tal procedimento, que torna nossa mente o padrão mais alto de verdade que a Palavra de Deus, é a raiz de todo o pecado intelectual.
d. Quarto, se negarmos a inerrância, devemos também dizer que a Bíblia esta errada não somente nos detalhes menos importantes, mas igualmente em algumas de suas doutrinas.
A negação da inerrância significa dizermos que o ensino da Bíblia a respeito da natureza da Escritura e a respeito da veracidade e confiabilidade das palavras de Deus também é falso. Esses não são pequenos detalhes, e sim preocupações doutrinárias muito importantes na Escritura.
e. A Palavra de Deus escrita é a nossa autoridade final. É importante perceber que a forma final na qual a Escritura é cheia de autoridade é a forma escrita. Foram as palavras de Deus escritas em tábuas de pedra que Moisés depositou na arca da aliança. Mais tarde, Deus ordenou a Moisés e subseqüentemente aos profetas para escreverem suas palavras em um livro. Foi a Palavra de Deus escrita que Paulo disse ser ”inspirada” (gr. graphē em 2Tm 3.16). Isso é importante porque as pessoas às vezes (de forma intencional ou não) tentam substituir as palavras escritas da Escritura por algum outro padrão final. Por exemplo, elas se referem ao “que Jesus realmente disse” e afirmam que, quando traduzimos as palavras gregas dos evangelhos para a língua aramaica que Jesus falou, podemos obter entendimento melhor das palavras de Jesus do que foi dado pelos escritores dos evangelhos. Em outros casos, há quem alegue conhecer ”o que Paulo realmente pensava” mesmo quando esse conhecimento é diferente do significado das palavras que ele escreveu. Ou falam do “que Paulo teria dito se ele tivesse sido coerente com o restante de sua teologia”. De modo semelhante, outras pessoas falam da “situação da igreja à qual Mateus está escrevendo” e tentam dar força normativa tanto para essa situação como para a solução que pensam que Mateus estava tentando produzir nessa situação.
Em todos esses exemplos, devemos admitir que perguntar a respeito das palavras ou situações que estão por trás do texto da Escritura pode, às vezes, ser útil para nós no entendimento do que o texto significa. Não obstante, nossas reconstruções hipotéticas dessas palavras ou situações podem nunca substituir ou competir com a própria Escritura como a autoridade final, nem devemos permitir que contradigam ou levantem dúvidas sobre a exatidão de qualquer das palavras da Escritura. Devemos continuamente relembrar que temos na Bíblia as verdadeiras palavras de Deus, e não podemos tentar “melhorá-las” de algum modo, pois isso não pode ser feito. Ao contrário, devemos procurar entendê-las e, então, confiar nelas e obedecer a elas de todo o nosso coração.
Embora as posições indesejáveis listadas acima estejam logicamente relacionadas à negação da inerrância, uma Palavra de advertência se faz necessária: nem todos que negam a inerrância adotarão também as conclusões indesejáveis mencionadas. Algumas pessoas (provavelmente de modo incoerente) negarão a inerrância, mas não caminharão para esses passos lógicos. Em debates sobre a inerrância, como em outras discussões teológicas, é importante que critiquemos as pessoas com base nas idéias que elas realmente sustentam e que distingamos claramente essas idéias das posições que pensamos que elas sustentam, para ver se estas estão de acordo com as próprias idéias afirmadas.
Fonte: Teologia Sistemática do autor, Ed. Vida NoA inerrância da Escritura
Autor: Wayne Grudem.
Podemos
dividir a história da igreja em períodos distintos. O primeiro deles
vai do 'século I ao V' e pode ser classificado como o período da
'patrística' ou dos 'pais da igreja'. Tivemos nesse período homens
piedosos que viveram com poder a vida cristã; entre eles, citamos
Inácio, Policarpo, Justino, Orígenes, Irineu, Clemente de Alexandria,
Tertuliano e Agostinho.
Na época dos pais da igreja tivemos o importante período dos grandes concílios, basicamente empenhados em grandes batalhas cristológicas. Em 325 d. C., aconteceu o primeiro concílio geral da igreja, quando Atanásio refutou as ideias heréticas de Ário, reafirmando a doutrina isofismável da divindade de Cristo. Em 381 d. C., no Concílio de Constantinopla, a igreja reafirmou a doutrina da perfeita humanidade de Cristo. No Concílio de Calcedônia, em 451 d. C., a igreja reafirmou que, "Jesus Cristo é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem; segundo a Divindade, consubstancial com o Pai; segundo a humanidade, consubstancial a nós". Ali ficava confirmada a doutrina da natureza teantrópica, ou seja, a natureza divino-humana de Jesus Cristo.
Foi, porém, em 416 d. C., no Sínodo de Cartago, que o maior expoente da igreja nesse período, Agostinho, derrubou uma das grandes heresias que grassava na igreja, disseminada por Pelágio. Este pregava que Adão fora criado mortal; que o pecado de Adão só havia contaminado a ele, e não à raça humana; que as crianças estão no mesmo estado de Adão antes de pecar e que o homem tem pleno poder de observar a lei. Agostinho, firmado na Palavra de Deus, reafirmou a doutrina Bíblica da depravação total do homem e de sua absoluta incapacidade em ser salvo sem a operação soberana da graça de Deus.
By: Rev. Hernandes Dias Lopes
Na época dos pais da igreja tivemos o importante período dos grandes concílios, basicamente empenhados em grandes batalhas cristológicas. Em 325 d. C., aconteceu o primeiro concílio geral da igreja, quando Atanásio refutou as ideias heréticas de Ário, reafirmando a doutrina isofismável da divindade de Cristo. Em 381 d. C., no Concílio de Constantinopla, a igreja reafirmou a doutrina da perfeita humanidade de Cristo. No Concílio de Calcedônia, em 451 d. C., a igreja reafirmou que, "Jesus Cristo é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem; segundo a Divindade, consubstancial com o Pai; segundo a humanidade, consubstancial a nós". Ali ficava confirmada a doutrina da natureza teantrópica, ou seja, a natureza divino-humana de Jesus Cristo.
Foi, porém, em 416 d. C., no Sínodo de Cartago, que o maior expoente da igreja nesse período, Agostinho, derrubou uma das grandes heresias que grassava na igreja, disseminada por Pelágio. Este pregava que Adão fora criado mortal; que o pecado de Adão só havia contaminado a ele, e não à raça humana; que as crianças estão no mesmo estado de Adão antes de pecar e que o homem tem pleno poder de observar a lei. Agostinho, firmado na Palavra de Deus, reafirmou a doutrina Bíblica da depravação total do homem e de sua absoluta incapacidade em ser salvo sem a operação soberana da graça de Deus.
By: Rev. Hernandes Dias Lopes
domingo, 9 de junho de 2013
A autoridade da Bíblia
EXPLICAÇÃO E BASE BÍBLICA
A autoridade da Escritura significa que todas as palavras da Escritura são palavras de Deus de tal modo que descrer ou desobedecer a qualquer palavra da Escritura é descrer ou desobedecer a Deus. Essa definição pode agora ser examinada em suas várias partes. Todas as palavras na Escritura são palavras de Deus.
1. Isso é o que a Bíblia declara sobre si própria.
Há freqüentes declarações na Bíblia de que todas as palavras da Escritura são palavras de Deus (assim como palavras que foram escritas por homens). No AT, isso é muitas vezes visto na frase introdutória “Assim diz O SENHOR”, que aparece centenas de vezes. No mundo do AT, essa frase teria sido reconhecida como idêntica na forma à frase “Assim diz o rei...”, que era usada para prefaciar o edito de um rei aos seus súditos, um edito que não poderia ser desafiado ou questionado, mas que simplesmente deveria ser obedecido. Portanto, quando os profetas dizem “Assim diz o SENHOR”, afirmam ser mensageiros do soberano Rei de Israel, a saber, o próprio Deus, e estão declarando que suas palavras são palavras totalmente plenas da autoridade de Deus. Quando o profeta falava no nome de Deus desse modo, cada palavra que ele falava tinha de proceder de Deus, ou ele seria um falso profeta (cf. Nm 22.38;Dt 18.18-20; Jr 1.9; 14.14; 23.16-22; 29.31,32; Ez 2.7; 13.1-16). Além disso, é muitas vezes dito que Deus fala “por meio” do profeta (1 Rs 14.18; 16.12,34; 2Rs 9.36; 14.25; Jr 37.2; Zc 7.7, 12).Assim, o que o profeta diz em nome de Deus é Deus quem diz (1 Rs 13.26 com v.21; lRs 21.19 com 2Rs 9.25,26;Ag 1.12; cf. lSm 15.3, l8).Nesses e em outros exemplos no AT, as palavras que os profetas falavam podem ser também referidas como as palavras que o próprio Deus falou. Portanto, descrer ou desobedecer a qualquer coisa que o profeta diz é descrer ou desobedecer ao próprio Deus (Dt 18.19; lSm 10.8; 13.13,14; 15.3,19,23; 1 Rs 20.35,36). Esses versículos, por si mesmos, não afirmam que todas as palavras no AT sejam palavras de Deus, porque em si mesmos estão se referindo somente a seções específicas de palavras faladas ou escritas no AT. Por força cumulativa dessas palavras, incluindo as centenas de passagens que começam com “Assim diz o Senhor”, deve ficar demonstrado que dentro do AT temos registros escritos de palavras que são consideradas as próprias palavras de Deus. Essas palavras constituem largas porções do AT. Quando percebemos que todas as palavras que faziam parte do “Livro da Lei de Deus” ou do “Livro da Aliança” foram consideradas palavras de Deus, vemos que a totalidade do AT afirma essa espécie de autoridade (v. Êx 24.7; Dt 29.21; 31.24-26; Is 24.26; lSm 10.25; 2Rs 23.2,3). No NT, várias passagens indicam que todas as palavras dos escritos do AT são consideradas palavras de Deus. 2Timotéo 3.16 diz: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça”. Aqui “Escritura” (gr. graphē)’ deve se referir aos escritos do AT, porque é a eles que a palavra graphē se refere em cada uma das suas 55 ocorrências no NT. Além disso, é às “Sagradas Letras” do AT que Paulo se referiu anteriormente no versículo 15. Paulo aqui afirma que todos os escritos do AT são theopneustos, inspirados por Deus. Visto que são escritos que foram “inspirados”, essa inspiração deve ser entendida como metáfora de falar as palavras da Escritura. Esse versículo, dessa maneira, afirma brevemente o que era evidente em muitas passagens do AT: OS escritos do AT são considerados Palavra de Deus em forma escrita. Pois Deus é quem falou (e ainda fala) cada palavra do AT, embora tenha usado agentes humanos para registrar essas palavras. Indicação similar do caráter dos escritos do AT como palavras de Deus é encontrada em 2Pedro 1.21. Falando das profecias da Escritura (v. 20), que significa ao menos as Escrituras do AT as quais Pedro encoraja seus leitores a prestar atenção cuidadosa (v. 19), Pedro diz que nenhuma dessas profecias jamais “teve origem na vontade humana”, mas que “homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo”. Não é a intenção de Pedro negar completamente o papel da volição ou da personalidade humana ao escrever a Escritura (ele diz que homens “falaram”), mas, em vez disso, sua intenção foi dizer que a fonte suprema de cada profecia não foi a decisão do homem a respeito do que ele queria escrever, mas, antes, a ação do Espírito Santo na vida do profeta, cumprida de modos não especificados aqui (ou, de fato, em nenhuma parte da Escritura). Isso indica a crença de que todas as profecias do AT (e, à luz dos v. 19 e 20, provavelmente inclua toda a Escritura registrada do AT) são consideradas “procedentes de Deus”: a saber, elas são as próprias palavras de Deus.
Muitas outras palavras poderiam ser citadas (v. Mt 19.5; Lc 1.70; 24.25; lo 5.45-47; At 3.18,21; 4.25; 13.47; 28.25; Rm 1.2; 3.2; 9.17; lCo 9.8-10; Hb 1.1,2,6,7), mas o padrão de atribuir a Deus as palavras da Escritura do AT deve estar muito claro. Além do mais, em diversos lugares, todas as palavras dos profetas ou as palavras da Escritura do AT levam a essa crença ou nos compelem a crer que são de Deus (v. Lc 24.25,27,44; At 3.18; 24.14; Rm 15.4). Mas, se Paulo estava se referindo somente aos escritos do AT quando falou de “toda a Escritura” como soprada por Deus em 2Timóteo 3.16, como pode esse versículo ser aplicado aos escritos do NT também? Será que esse versículo diz alguma coisa a respeito do caráter dos escritos do NT? Para responder a essas perguntas, devemos perceber que a palavra grega graphē (“escritura”) era o termo técnico para os escritores do NT e possuía um sentido altamente especializado. Embora ela seja usada 55 vezes no NT, em cada uma delas ela se refere aos escritos do AT, não a quaisquer outras palavras ou escritos fora do cânon da Escritura. Assim, cada coisa que pertencia à categoria “escritura” tinha o caráter de ser “soprada por Deus”: suas palavras eram as verdadeiras palavras de Deus. Mas em dois lugares no NT vemos os escritos do NT também serem chamados “Escritura” juntamente com os escritos do AT. Em 2Pedro 3.15,16, Pedro diz: “Tenham em mente que a paciência de nosso Senhor significa salvação, como também o nosso amado irmão Paulo lhes escreveu, com a sabedoria que Deus lhe deu. Ele escreve da mesma forma em todas as suas cartas, falando nelas destes assuntos. Suas cartas contêm algumas coisas difíceis de entender, as quais os ignorantes e instáveis torcem, como também o fazem com as demais Escrituras, para a própria destruição deles”. Aqui Pedro mostra não somente a consciência da existência de cartas escritas de Paulo, mas também a clara disposição de classificar equivalentemente “todas as suas [de Paulo] cartas” com “as demais Escrituras”. Isso é a indicação de que muito cedo na história da igreja todas as cartas de Paulo foram consideradas palavras de Deus em forma escrita no mesmo sentido que os textos escritos do AT. Semelhantemente, em lTimóteo 5.18, Paulo escreve: “... pois a Escritura diz: ‘Não amordace o boi enquanto está debulhando o cereal’, e ‘o trabalhador merece o seu salário”’. A primeira citação vem de Deuteronômio 25.4, mas a segunda não ocorre em nenhum lugar do AT. ao contrário, a citação de Lucas 10.7. Paulo aqui cita as palavras de Jesus conforme encontradas no evangelho de Lucas e as chama “Escritura”. Essas duas passagens tomadas juntas indicam que durante o tempo do registro dos documentos do NT havia a consciência de que adições foram sendo feitas a essa categoria especial de escritos chamada “escritura”, escritos que tinham o mesmo caráter das verdadeiras palavras de Deus. Assim, uma vez estabelecido que os escritos do NT pertencem à categoria especial de “escritura”, estamos certos em aplicar 2Timóteo 3.16 igualmente àqueles escritos e em dizer que aqueles escritos também possuem a característica que Paulo atribui a “toda a Escritura”: ela é “soprada por Deus”, e todas as suas palavras são as verdadeiras palavras de Deus. Existe evidência adicional de que os escritores do NT pensaram em seus escritos (não apenas os do AT) como as palavras de Deus? Em alguns casos, há. Em lCoríntios 14.37, Paulo diz: “Se alguém pensa que é profeta ou espiritual, reconheça que o que lhes estou escrevendo é mandamento do Senhor”. Aqui Paulo instituiu regras para a adoração na igreja de Corinto e exigiu que fossem reconhecidas por “mandamento do Senhor”. Alguém poderia pensar que Paulo achava que suas ordens fossem inferiores às de Jesus Cristo e, portanto, não precisavam ser cuidadosamente obedecidas. Por exemplo, em 1 Coríntios 7.12, ele distingue suas palavras das de Jesus: “Aos outros, eu mesmo digo isto, não o Senhor...”. Isso, contudo, simplesmente significa que ele não tinha conhecimento de nenhuma palavra dita aqui na terra que Jesus houvesse falado sobre o assunto. Podemos perceber que esse é o caso, porque nos versículos 10 e 11 ele simplesmente repetiu o ensino terreno de Jesus de que “a esposa não se separe do seu marido” e “o marido não se divorcie da sua mulher”. Nos versículos de 12 a 15, contudo, Paulo dá as suas instruções acerca de um assunto sobre o qual aparentemente Jesus não falara nada. O que dera a Paulo o direito de agir assim? Paulo diz que falou “como alguém que, pela misericórdia de Deus, é digno de confiança” (lCo 7.25). Ele parece sugerir aqui que seus julgamentos deviam ser considerados como cheios de autoridade, como as ordenanças de Jesus!
Indicações de idéias semelhantes dos escritos do NT são encontrados em João 14.26 e 16.13, onde Jesus prometeu que o Espírito Santo haveria de trazer à lembrança dos discípulos tudo o que ele lhes havia dito e que os guiaria a toda a verdade. Isso aponta para a obra do Espírito de capacitar os discípulos a se lembrarem e registrarem sem erro tudo o que Jesus havia dito. Indicações semelhantes são encontradas também em 2Pedro 3.2; lCoríntios 2.13; 1Tessalonicenses 4.15 e Apocalipse 22.18,19.
2. Ficamos convencidos das declarações da Bíblia de ser a Palavra de Deus à medida que a lemos.
Uma coisa é afirmar que a Bíblia alega ser as palavras de Deus; outra coisa é ser convencido de que essa alegação é verdadeira. Nossa convicção suprema de que as palavras da Bíblia são palavras de Deus vem somente quando o Espírito Santo fala em e por meio das palavras da Bíblia ao nosso coração e nos dá a certeza interior de que essas são as palavras do Criador para nós. Sem a obra do Espírito de Deus, a pessoa nunca receberá ou aceitará a verdade de que as palavras da Bíblia são de fato as palavras de Deus. Mas para aqueles em quem o Espírito de Deus está operando, há o reconhecimento de que as palavras da Bíblia são as palavras de Deus. Esse processo é intimamente análogo ao qual as pessoas que criam em Jesus sabiam que as palavras dele eram verdadeiras. Ele disse: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem” (Jo 10.27). Os que são ovelhas de Cristo ouvem as palavras de Cristo, o grande Pastor delas, da mesma maneira que lêem as palavras da Escritura, e se convencem de que essas palavras são, de fato, as palavras do seu Senhor. É importante lembrar que essa convicção de que as palavras da Escritura são as palavras de Deus não vem separada das palavras da Escritura ou em acréscimo às palavras da Escritura. Não é que o Espírito Santo cochiche em nosso ouvido, dizendo: ”Você vê aquela Bíblia sobre a sua escrivaninha? Eu quero que você saiba que as palavras daquela Bíblia são as palavras de Deus”. Ao contrário, enquanto as pessoas lêem a Escritura é que percebem que o livro que estão lendo é diferente de qualquer outro livro, que ele é de fato o livro que contém as próprias palavras de Deus falando ao coração delas. Um movimento teológico influente no século XX foi chamado de neo-ortodoxia. O representante mais importante desse movimento foi o teólogo suíço Karl Barth (1886- 1968). Embora muitos de seus escritos tenham proporcionado uma reafirmação bem- vinda dos ensinos da Bíblia, em distinção da incredulidade da teologia liberal da Alemanha, Barth não chegou a afirmar que todas as palavras da Bíblia são as palavras de Deus no sentido em que temos argumentado aqui. Ao contrário, ele disse que as palavras da Escritura tornam-se as palavras de Deus para nós à medida que nos encontramos com elas. Essa foi a razão primária por que os evangélicos não puderam apoiar completamente a neo-ortodoxia de Barth, embora tivessem apreciado muitas das coisas que ele ensinou isoladamente.
3. Outra evidência é útil, mas não totalmente convincente.
A seção anterior não foi proposta para negar a validade de outras espécies de argumentos que podem ser usados para dar apoio à declaração de que a Bíblia é o conjunto das palavras de Deus. É útil para nós aprendermos que a Bíblia é historicamente precisa, internamente coerente, que contém profecias que foram cumpridas centenas de anos mais tarde, que influenciou o curso da história humana mais que qualquer outro livro, que continua a mudar a vida de milhões de indivíduos ao longo de toda a história, que por meio dela pessoas têm encontrado a salvação, que ela tem uma beleza majestosa e uma profundidade muito grande de ensino não alcançada por nenhum outro livro, e que ela afirma centenas de vezes que suas palavras são as palavras de Deus. Todos esses argumentos são úteis para nós e removem obstáculos que poderiam, de outra forma, aparecer no caminho de nossa fé na Escritura. Mas todos eles, tomados individualmente ou em conjunto, não podem convencer de forma final. É isso que a Confissão de é de Westminster de 1643-1646 diz: Pelo testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente apreço pela Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, a eficácia da sua doutrina, a majestade de seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu todo (que é dar a Deus toda a glória), a plena revelação que faz do único meio de salvar- se o homem, as suas muitas outras excelências incomparáveis e completa perfeição são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser ela a palavra de Deus; contudo, a nossa plena persuasão e a certeza da sua infalível verdade e divina autoridade provém da operação interna do Espírito Santo, que pela palavra, e com a palavra testifica em nosso coração. (I,V)
4. As palavras da Escritura são auto-testificadoras.
Visto que as palavras da Escritura são “autotestificadoras”, não se pode “provar” que elas são as palavras de Deus no apelo a uma autoridade superior. Se apelarmos, por exemplo, à lógica humana ou à verdade científica para provar que a Bíblia é a Palavra de Deus, então presumimos que a autoridade à qual apelamos é superior às próprias palavras de Deus ou que é mais verdadeiro ou mais confiável. Portanto, a autoridade suprema pela qual a Escritura demonstra ser a Palavra de Deus deve ser a própria Escritura.
5. Objeção: esse é um argumento circular.
Alguém pode objetar que dizer que a própria Escritura demonstra ser as palavras de Deus é um argumento circular: Cremos que a Escritura é a Palavra de Deus porque ela alega isso. E cremos em sua alegação porque a Escritura é a Palavra de Deus. E cremos que ela é a Palavra de Deus porque ela o diz, e assim por diante. Deve-se admitir que esse é uma espécie de argumento circular. Contudo, isso não torna o seu uso inválido, pois todos os argumentos para uma autoridade absoluta devem apelar supremamente para aquela autoridade a fim de que seja provada; de outra forma, a autoridade não seria uma autoridade absoluta ou superior. Esse problema não é exclusivo do cristão que está argumentando pela autoridade da Bíblia. Qualquer pessoa, implícita ou explicitamente, usa alguma espécie de argumento circular quando defende sua autoridade suprema para provar qualquer crença. Alguns poucos exemplos simples ilustrarão os tipos de argumento circular que as pessoas usam para dar apoio às bases de suas crenças: Minha razão é a autoridade suprema porque isso me parece razoável. A coerência lógica é minha autoridade suprema porque é lógico agir assim. As descobertas das experiências sensoriais dos homens são a autoridade suprema para descobrir o que é real e o que não é, porque nossos sentidos nunca descobriram outra coisa mais: assim, a experiência sensória do homem me diz que o meu princípio é verdadeiro. Cada um desses argumentos utiliza um raciocínio circular para estabelecer um padrão definitivo para comprovar a verdade. Como então o cristão ou qualquer outra pessoa pode escolher entre as várias reivindicações de autoridade absoluta? De modo definitivo, a veracidade da Bíblia recomenda a si mesma como muito mais persuasiva que outros livros religiosos (como o Livro de Mórmon ou o Alcorão) ou mais que outras construções intelectuais da mente humana (como lógica, razão humana, experiência sensória, metodologia científica etc.). Será que ela é mais persuasiva porque, na real experiência da vida, todas essas outras candidatas a autoridade suprema são vistas como incoerentes ou como tendo defeitos que as desqualificam, ao passo que a Bíblia será vista como estando de pleno acordo com tudo o que sabemos a respeito do mundo ao nosso redor, a respeito de nós mesmos e a respeito de Deus? A Bíblia recomenda-se a si mesma como persuasiva desse modo, isto é, se estamos pensando corretamente sobre a natureza da realidade, sobre nossa percepção dela e de nós próprios, e sobre nossa percepção de Deus. O problema é que, por causa do pecado, nossa percepção e análise de Deus e da criação são imperfeitas. Portanto, ela requer a obra do Espírito Santo, vencendo os efeitos do pecado, para capacitar-nos a sermos persuadidos de que a Bíblia é, de fato, a Palavra de Deus e que a afirmação que ela faz de si mesma é verdadeira. Em outro sentido, portanto, o argumento da Bíblia como a Palavra de Deus e nossa autoridade suprema não é um típico argumento circular. Esse processo de persuasão é talvez mais comparável a uma espiral na qual o crescente conhecimento da Escritura e o crescente entendimento correto de Deus e da criação tendem a suplementar um ao outro de modo harmonioso, cada um tendendo a confirmar a precisão do outro. Isso não é o mesmo que dizer que o nosso conhecimento do mundo ao redor serve como autoridade maior que a Escritura, mas, ao contrário, que tal conhecimento, se é o conhecimento correto, continua a dar uma certeza maior e melhor, além de uma convicção mais profunda, de que a Bíblia é a autoridade única e verdadeiramente suprema, e que outras afirmações competidoras de autoridade suprema são falsas.
6. Isso não significa ditado de Deus como o único meio de comunicação.
Neste momento é necessária uma palavra de advertência. O fato de que todas as palavras da Escritura são as palavras de Deus não deve nos levar a pensar que Deus ditou cada palavra da Escritura aos autores humanos. Quando dizemos que todas as palavras da Bíblia são as palavras de Deus, estamos falando a respeito do resultado do processo que trouxe a Escritura à existência. A questão do ditado diz respeito ao processo que conduziu ao resultado ou à maneira pela qual Deus agiu a fim de assegurar o resultado que ele pretendia. Deve ser enfatizado que a Bíblia não fala de um único tipo de processo ou de uma única maneira pela qual Deus comunicou aos autores bíblicos o que ele queria que fosse dito. De fato, há indicação de uma grande variedade de processos que Deus usou para conseguir o resultado desejado. Uns poucos exemplos esparsos de ditado são mencionados explicitamente na Escritura. Quando o apóstolo João viu o Senhor ressuscitado na visão na ilha de Patmos, Jesus lhe falou o seguinte: “Ao anjo da igreja em Éfeso escreva” (Ap 2.1); “Ao anjo da igreja em Esmirna escreva” (Ap 2.8); “Ao anjo da igreja em Pérgamo escreva” (Ap 2.12). Esses são exemplos de puro e simples ditado. O Senhor ressuscitado diz a João o que escrever, e João escreve as palavras que ouve de Jesus. Porém, em muitas outras seções da Escritura, tal ditado direto de Deus não é certamente a maneira pela qual as palavras da Escritura vieram à existência. O autor de Hebreus diz que Deus falou aos pais pelos profetas “muitas vezes e de várias maneiras” (Hb 1.1). Do outro lado do espectro do ditado temos, por exemplo, a pesquisa histórica ordinária que Lucas empreendeu para escrever seu evangelho. Ele diz: “Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram entre nós, conforme nos foram transmitidos por aqueles que desde o início foram testemunhas oculares e servos da palavra. Eu mesmo investiguei tudo cuidadosamente, desde o começo, e decidi escrever-te um relato ordenado, ó excelentíssimo Teófilo” (Lc 1.1-3). Esse claramente não é o processo de ditado. Lucas usou o método comum de conversar com testemunhas oculares e obter dados históricos de forma que pudesse escrever sua narrativa precisa da vida e dos ensinos de Jesus. Fez a pesquisa histórica de maneira completa, ouvindo relatos de muitas testemunhas oculares e avaliando sua evidência cuidadosamente. O evangelho que escreveu enfatiza e reflete seu estilo característico de escrever. Entre os dois extremos, do ditado por um lado e da pesquisa histórica ordinária por outro, temos muitas indicações de vários modos pelos quais Deus comunicou-se com os autores humanos da Escritura. Em alguns casos, a Escritura fala de sonhos, visões ou de ouvir a voz do Senhor. Em outros casos, ela fala de homens que estiveram com Jesus, observaram sua vida e ouviram seus ensinos, homens cuja lembrança dessas palavras e ações tornou-se completamente precisa pela operação do Espírito Santo, à medida que ele as trazia à memória deles (Jo 14.26). Ao que parece, muitos métodos diferentes foram usados, mas não é importante que descubramos exatamente quais foram eles em cada caso. Em exemplos em que a personalidade humana e o estilo de escrever do autor estavam proeminentemente envolvidos, como parece ser o caso com a maior parte da Escritura, tudo o que somos capazes de dizer é que a superintendência e a direção providenciais de Deus na vida de cada autor foram de tal ordem que a personalidade e a habilidade deles foram exatamente o que Deus queria que fossem para a tarefa de escrever a Escritura. As origens e o treinamento deles (como a preparação rabínica de Paulo, a de Moisés na casa de Faraó ou o trabalho de Davi como pastor), a capacidade de avaliar eventos no mundo ao redor deles, o acesso que tinham a dados históricos, seu julgamento com relação à exatidão de informações e as circunstâncias individuais quando escreveram foram exatamente o que Deus queria que fossem. Assim, quando eles realmente chegaram a escrever, as palavras eram plenamente as suas próprias palavras, mas também eram plenamente as palavras que Deus queria que eles escrevessem, palavras que Deus também afirmaria serem suas.
Portanto, descrer ou desobedecer a qualquer palavra da Escritura é descrer ou desobedecer a Deus.
A seção anterior argumentou que todas as palavras da Escritura são palavras de Deus. Conseqüentemente, descrer ou desobedecer a qualquer palavra da Escritura é descrer ou desobedecer ao próprio Deus.Assim, Jesus pôde repreender seus discípulos por não crerem nas Escrituras do AT (Lc 24.25: “Como vocês custam a entender e como demoram a crer em tudo o que os profetas falaram!”). Os crentes devem guardar ou obedecer às palavras dos discípulos (Jo 15.20: “... Se obedeceram, à minha palavra, também obedecerão à de vocês”). Os cristãos são encorajados a lembrar-se do “mandamento de nosso Senhor e Salvador que os apóstolos de vocês lhes ensinaram” (2Pe 3.2). Desobedecer aos escritos de Paulo era tornar-se sujeito à disciplina da igreja, como a excomunhão (2Ts 3.14) e a punição espiritual (2Co 13.2,3), incluindo a punição de Deus (esse é o sentido evidente do verbo na voz passiva “será ignorado” em lCo 14.38). Por contraste, Deus se agrada de cada pessoa que “treme” diante da sua palavra (Is 66.2). Ao longo de toda a história da igreja, os maiores pregadores têm sido os que reconheceram que não possuem autoridade vinda de si mesmos; sua tarefa tem sido a explicação das palavras da Escritura e a sua clara aplicação na vida de seus ouvintes. A pregação deles deriva seu poder não da proclamação de suas experiências cristãs ou das experiências de outros, nem de suas opiniões, idéias criativas ou habilidades retóricas, mas das poderosas palavras de Deus. Essencialmente, eles permaneceram no púlpito, apontaram para o texto bíblico e disseram de fato à sua congregação: “Isso é o que esse versículo quer dizer. Você também vê esse significado aqui? Então, você deve crer nele e obedecer a ele de todo o seu coração, porque o próprio Criador e Senhor está dizendo exatamente isso para você hoje!”.
Somente as palavras escritas da Escritura podem dar essa espécie de autoridade à pregação.
Autor: Wayne Grudem Fonte: Teologia Sistemática do Autor; Ed. Vida Nova.
EXPLICAÇÃO E BASE BÍBLICA
A autoridade da Escritura significa que todas as palavras da Escritura são palavras de Deus de tal modo que descrer ou desobedecer a qualquer palavra da Escritura é descrer ou desobedecer a Deus. Essa definição pode agora ser examinada em suas várias partes. Todas as palavras na Escritura são palavras de Deus.
1. Isso é o que a Bíblia declara sobre si própria.
Há freqüentes declarações na Bíblia de que todas as palavras da Escritura são palavras de Deus (assim como palavras que foram escritas por homens). No AT, isso é muitas vezes visto na frase introdutória “Assim diz O SENHOR”, que aparece centenas de vezes. No mundo do AT, essa frase teria sido reconhecida como idêntica na forma à frase “Assim diz o rei...”, que era usada para prefaciar o edito de um rei aos seus súditos, um edito que não poderia ser desafiado ou questionado, mas que simplesmente deveria ser obedecido. Portanto, quando os profetas dizem “Assim diz o SENHOR”, afirmam ser mensageiros do soberano Rei de Israel, a saber, o próprio Deus, e estão declarando que suas palavras são palavras totalmente plenas da autoridade de Deus. Quando o profeta falava no nome de Deus desse modo, cada palavra que ele falava tinha de proceder de Deus, ou ele seria um falso profeta (cf. Nm 22.38;Dt 18.18-20; Jr 1.9; 14.14; 23.16-22; 29.31,32; Ez 2.7; 13.1-16). Além disso, é muitas vezes dito que Deus fala “por meio” do profeta (1 Rs 14.18; 16.12,34; 2Rs 9.36; 14.25; Jr 37.2; Zc 7.7, 12).Assim, o que o profeta diz em nome de Deus é Deus quem diz (1 Rs 13.26 com v.21; lRs 21.19 com 2Rs 9.25,26;Ag 1.12; cf. lSm 15.3, l8).Nesses e em outros exemplos no AT, as palavras que os profetas falavam podem ser também referidas como as palavras que o próprio Deus falou. Portanto, descrer ou desobedecer a qualquer coisa que o profeta diz é descrer ou desobedecer ao próprio Deus (Dt 18.19; lSm 10.8; 13.13,14; 15.3,19,23; 1 Rs 20.35,36). Esses versículos, por si mesmos, não afirmam que todas as palavras no AT sejam palavras de Deus, porque em si mesmos estão se referindo somente a seções específicas de palavras faladas ou escritas no AT. Por força cumulativa dessas palavras, incluindo as centenas de passagens que começam com “Assim diz o Senhor”, deve ficar demonstrado que dentro do AT temos registros escritos de palavras que são consideradas as próprias palavras de Deus. Essas palavras constituem largas porções do AT. Quando percebemos que todas as palavras que faziam parte do “Livro da Lei de Deus” ou do “Livro da Aliança” foram consideradas palavras de Deus, vemos que a totalidade do AT afirma essa espécie de autoridade (v. Êx 24.7; Dt 29.21; 31.24-26; Is 24.26; lSm 10.25; 2Rs 23.2,3). No NT, várias passagens indicam que todas as palavras dos escritos do AT são consideradas palavras de Deus. 2Timotéo 3.16 diz: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça”. Aqui “Escritura” (gr. graphē)’ deve se referir aos escritos do AT, porque é a eles que a palavra graphē se refere em cada uma das suas 55 ocorrências no NT. Além disso, é às “Sagradas Letras” do AT que Paulo se referiu anteriormente no versículo 15. Paulo aqui afirma que todos os escritos do AT são theopneustos, inspirados por Deus. Visto que são escritos que foram “inspirados”, essa inspiração deve ser entendida como metáfora de falar as palavras da Escritura. Esse versículo, dessa maneira, afirma brevemente o que era evidente em muitas passagens do AT: OS escritos do AT são considerados Palavra de Deus em forma escrita. Pois Deus é quem falou (e ainda fala) cada palavra do AT, embora tenha usado agentes humanos para registrar essas palavras. Indicação similar do caráter dos escritos do AT como palavras de Deus é encontrada em 2Pedro 1.21. Falando das profecias da Escritura (v. 20), que significa ao menos as Escrituras do AT as quais Pedro encoraja seus leitores a prestar atenção cuidadosa (v. 19), Pedro diz que nenhuma dessas profecias jamais “teve origem na vontade humana”, mas que “homens falaram da parte de Deus, impelidos pelo Espírito Santo”. Não é a intenção de Pedro negar completamente o papel da volição ou da personalidade humana ao escrever a Escritura (ele diz que homens “falaram”), mas, em vez disso, sua intenção foi dizer que a fonte suprema de cada profecia não foi a decisão do homem a respeito do que ele queria escrever, mas, antes, a ação do Espírito Santo na vida do profeta, cumprida de modos não especificados aqui (ou, de fato, em nenhuma parte da Escritura). Isso indica a crença de que todas as profecias do AT (e, à luz dos v. 19 e 20, provavelmente inclua toda a Escritura registrada do AT) são consideradas “procedentes de Deus”: a saber, elas são as próprias palavras de Deus.
Muitas outras palavras poderiam ser citadas (v. Mt 19.5; Lc 1.70; 24.25; lo 5.45-47; At 3.18,21; 4.25; 13.47; 28.25; Rm 1.2; 3.2; 9.17; lCo 9.8-10; Hb 1.1,2,6,7), mas o padrão de atribuir a Deus as palavras da Escritura do AT deve estar muito claro. Além do mais, em diversos lugares, todas as palavras dos profetas ou as palavras da Escritura do AT levam a essa crença ou nos compelem a crer que são de Deus (v. Lc 24.25,27,44; At 3.18; 24.14; Rm 15.4). Mas, se Paulo estava se referindo somente aos escritos do AT quando falou de “toda a Escritura” como soprada por Deus em 2Timóteo 3.16, como pode esse versículo ser aplicado aos escritos do NT também? Será que esse versículo diz alguma coisa a respeito do caráter dos escritos do NT? Para responder a essas perguntas, devemos perceber que a palavra grega graphē (“escritura”) era o termo técnico para os escritores do NT e possuía um sentido altamente especializado. Embora ela seja usada 55 vezes no NT, em cada uma delas ela se refere aos escritos do AT, não a quaisquer outras palavras ou escritos fora do cânon da Escritura. Assim, cada coisa que pertencia à categoria “escritura” tinha o caráter de ser “soprada por Deus”: suas palavras eram as verdadeiras palavras de Deus. Mas em dois lugares no NT vemos os escritos do NT também serem chamados “Escritura” juntamente com os escritos do AT. Em 2Pedro 3.15,16, Pedro diz: “Tenham em mente que a paciência de nosso Senhor significa salvação, como também o nosso amado irmão Paulo lhes escreveu, com a sabedoria que Deus lhe deu. Ele escreve da mesma forma em todas as suas cartas, falando nelas destes assuntos. Suas cartas contêm algumas coisas difíceis de entender, as quais os ignorantes e instáveis torcem, como também o fazem com as demais Escrituras, para a própria destruição deles”. Aqui Pedro mostra não somente a consciência da existência de cartas escritas de Paulo, mas também a clara disposição de classificar equivalentemente “todas as suas [de Paulo] cartas” com “as demais Escrituras”. Isso é a indicação de que muito cedo na história da igreja todas as cartas de Paulo foram consideradas palavras de Deus em forma escrita no mesmo sentido que os textos escritos do AT. Semelhantemente, em lTimóteo 5.18, Paulo escreve: “... pois a Escritura diz: ‘Não amordace o boi enquanto está debulhando o cereal’, e ‘o trabalhador merece o seu salário”’. A primeira citação vem de Deuteronômio 25.4, mas a segunda não ocorre em nenhum lugar do AT. ao contrário, a citação de Lucas 10.7. Paulo aqui cita as palavras de Jesus conforme encontradas no evangelho de Lucas e as chama “Escritura”. Essas duas passagens tomadas juntas indicam que durante o tempo do registro dos documentos do NT havia a consciência de que adições foram sendo feitas a essa categoria especial de escritos chamada “escritura”, escritos que tinham o mesmo caráter das verdadeiras palavras de Deus. Assim, uma vez estabelecido que os escritos do NT pertencem à categoria especial de “escritura”, estamos certos em aplicar 2Timóteo 3.16 igualmente àqueles escritos e em dizer que aqueles escritos também possuem a característica que Paulo atribui a “toda a Escritura”: ela é “soprada por Deus”, e todas as suas palavras são as verdadeiras palavras de Deus. Existe evidência adicional de que os escritores do NT pensaram em seus escritos (não apenas os do AT) como as palavras de Deus? Em alguns casos, há. Em lCoríntios 14.37, Paulo diz: “Se alguém pensa que é profeta ou espiritual, reconheça que o que lhes estou escrevendo é mandamento do Senhor”. Aqui Paulo instituiu regras para a adoração na igreja de Corinto e exigiu que fossem reconhecidas por “mandamento do Senhor”. Alguém poderia pensar que Paulo achava que suas ordens fossem inferiores às de Jesus Cristo e, portanto, não precisavam ser cuidadosamente obedecidas. Por exemplo, em 1 Coríntios 7.12, ele distingue suas palavras das de Jesus: “Aos outros, eu mesmo digo isto, não o Senhor...”. Isso, contudo, simplesmente significa que ele não tinha conhecimento de nenhuma palavra dita aqui na terra que Jesus houvesse falado sobre o assunto. Podemos perceber que esse é o caso, porque nos versículos 10 e 11 ele simplesmente repetiu o ensino terreno de Jesus de que “a esposa não se separe do seu marido” e “o marido não se divorcie da sua mulher”. Nos versículos de 12 a 15, contudo, Paulo dá as suas instruções acerca de um assunto sobre o qual aparentemente Jesus não falara nada. O que dera a Paulo o direito de agir assim? Paulo diz que falou “como alguém que, pela misericórdia de Deus, é digno de confiança” (lCo 7.25). Ele parece sugerir aqui que seus julgamentos deviam ser considerados como cheios de autoridade, como as ordenanças de Jesus!
Indicações de idéias semelhantes dos escritos do NT são encontrados em João 14.26 e 16.13, onde Jesus prometeu que o Espírito Santo haveria de trazer à lembrança dos discípulos tudo o que ele lhes havia dito e que os guiaria a toda a verdade. Isso aponta para a obra do Espírito de capacitar os discípulos a se lembrarem e registrarem sem erro tudo o que Jesus havia dito. Indicações semelhantes são encontradas também em 2Pedro 3.2; lCoríntios 2.13; 1Tessalonicenses 4.15 e Apocalipse 22.18,19.
2. Ficamos convencidos das declarações da Bíblia de ser a Palavra de Deus à medida que a lemos.
Uma coisa é afirmar que a Bíblia alega ser as palavras de Deus; outra coisa é ser convencido de que essa alegação é verdadeira. Nossa convicção suprema de que as palavras da Bíblia são palavras de Deus vem somente quando o Espírito Santo fala em e por meio das palavras da Bíblia ao nosso coração e nos dá a certeza interior de que essas são as palavras do Criador para nós. Sem a obra do Espírito de Deus, a pessoa nunca receberá ou aceitará a verdade de que as palavras da Bíblia são de fato as palavras de Deus. Mas para aqueles em quem o Espírito de Deus está operando, há o reconhecimento de que as palavras da Bíblia são as palavras de Deus. Esse processo é intimamente análogo ao qual as pessoas que criam em Jesus sabiam que as palavras dele eram verdadeiras. Ele disse: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem” (Jo 10.27). Os que são ovelhas de Cristo ouvem as palavras de Cristo, o grande Pastor delas, da mesma maneira que lêem as palavras da Escritura, e se convencem de que essas palavras são, de fato, as palavras do seu Senhor. É importante lembrar que essa convicção de que as palavras da Escritura são as palavras de Deus não vem separada das palavras da Escritura ou em acréscimo às palavras da Escritura. Não é que o Espírito Santo cochiche em nosso ouvido, dizendo: ”Você vê aquela Bíblia sobre a sua escrivaninha? Eu quero que você saiba que as palavras daquela Bíblia são as palavras de Deus”. Ao contrário, enquanto as pessoas lêem a Escritura é que percebem que o livro que estão lendo é diferente de qualquer outro livro, que ele é de fato o livro que contém as próprias palavras de Deus falando ao coração delas. Um movimento teológico influente no século XX foi chamado de neo-ortodoxia. O representante mais importante desse movimento foi o teólogo suíço Karl Barth (1886- 1968). Embora muitos de seus escritos tenham proporcionado uma reafirmação bem- vinda dos ensinos da Bíblia, em distinção da incredulidade da teologia liberal da Alemanha, Barth não chegou a afirmar que todas as palavras da Bíblia são as palavras de Deus no sentido em que temos argumentado aqui. Ao contrário, ele disse que as palavras da Escritura tornam-se as palavras de Deus para nós à medida que nos encontramos com elas. Essa foi a razão primária por que os evangélicos não puderam apoiar completamente a neo-ortodoxia de Barth, embora tivessem apreciado muitas das coisas que ele ensinou isoladamente.
3. Outra evidência é útil, mas não totalmente convincente.
A seção anterior não foi proposta para negar a validade de outras espécies de argumentos que podem ser usados para dar apoio à declaração de que a Bíblia é o conjunto das palavras de Deus. É útil para nós aprendermos que a Bíblia é historicamente precisa, internamente coerente, que contém profecias que foram cumpridas centenas de anos mais tarde, que influenciou o curso da história humana mais que qualquer outro livro, que continua a mudar a vida de milhões de indivíduos ao longo de toda a história, que por meio dela pessoas têm encontrado a salvação, que ela tem uma beleza majestosa e uma profundidade muito grande de ensino não alcançada por nenhum outro livro, e que ela afirma centenas de vezes que suas palavras são as palavras de Deus. Todos esses argumentos são úteis para nós e removem obstáculos que poderiam, de outra forma, aparecer no caminho de nossa fé na Escritura. Mas todos eles, tomados individualmente ou em conjunto, não podem convencer de forma final. É isso que a Confissão de é de Westminster de 1643-1646 diz: Pelo testemunho da Igreja podemos ser movidos e incitados a um alto e reverente apreço pela Escritura Sagrada; a suprema excelência do seu conteúdo, a eficácia da sua doutrina, a majestade de seu estilo, a harmonia de todas as suas partes, o escopo do seu todo (que é dar a Deus toda a glória), a plena revelação que faz do único meio de salvar- se o homem, as suas muitas outras excelências incomparáveis e completa perfeição são argumentos pelos quais abundantemente se evidencia ser ela a palavra de Deus; contudo, a nossa plena persuasão e a certeza da sua infalível verdade e divina autoridade provém da operação interna do Espírito Santo, que pela palavra, e com a palavra testifica em nosso coração. (I,V)
4. As palavras da Escritura são auto-testificadoras.
Visto que as palavras da Escritura são “autotestificadoras”, não se pode “provar” que elas são as palavras de Deus no apelo a uma autoridade superior. Se apelarmos, por exemplo, à lógica humana ou à verdade científica para provar que a Bíblia é a Palavra de Deus, então presumimos que a autoridade à qual apelamos é superior às próprias palavras de Deus ou que é mais verdadeiro ou mais confiável. Portanto, a autoridade suprema pela qual a Escritura demonstra ser a Palavra de Deus deve ser a própria Escritura.
5. Objeção: esse é um argumento circular.
Alguém pode objetar que dizer que a própria Escritura demonstra ser as palavras de Deus é um argumento circular: Cremos que a Escritura é a Palavra de Deus porque ela alega isso. E cremos em sua alegação porque a Escritura é a Palavra de Deus. E cremos que ela é a Palavra de Deus porque ela o diz, e assim por diante. Deve-se admitir que esse é uma espécie de argumento circular. Contudo, isso não torna o seu uso inválido, pois todos os argumentos para uma autoridade absoluta devem apelar supremamente para aquela autoridade a fim de que seja provada; de outra forma, a autoridade não seria uma autoridade absoluta ou superior. Esse problema não é exclusivo do cristão que está argumentando pela autoridade da Bíblia. Qualquer pessoa, implícita ou explicitamente, usa alguma espécie de argumento circular quando defende sua autoridade suprema para provar qualquer crença. Alguns poucos exemplos simples ilustrarão os tipos de argumento circular que as pessoas usam para dar apoio às bases de suas crenças: Minha razão é a autoridade suprema porque isso me parece razoável. A coerência lógica é minha autoridade suprema porque é lógico agir assim. As descobertas das experiências sensoriais dos homens são a autoridade suprema para descobrir o que é real e o que não é, porque nossos sentidos nunca descobriram outra coisa mais: assim, a experiência sensória do homem me diz que o meu princípio é verdadeiro. Cada um desses argumentos utiliza um raciocínio circular para estabelecer um padrão definitivo para comprovar a verdade. Como então o cristão ou qualquer outra pessoa pode escolher entre as várias reivindicações de autoridade absoluta? De modo definitivo, a veracidade da Bíblia recomenda a si mesma como muito mais persuasiva que outros livros religiosos (como o Livro de Mórmon ou o Alcorão) ou mais que outras construções intelectuais da mente humana (como lógica, razão humana, experiência sensória, metodologia científica etc.). Será que ela é mais persuasiva porque, na real experiência da vida, todas essas outras candidatas a autoridade suprema são vistas como incoerentes ou como tendo defeitos que as desqualificam, ao passo que a Bíblia será vista como estando de pleno acordo com tudo o que sabemos a respeito do mundo ao nosso redor, a respeito de nós mesmos e a respeito de Deus? A Bíblia recomenda-se a si mesma como persuasiva desse modo, isto é, se estamos pensando corretamente sobre a natureza da realidade, sobre nossa percepção dela e de nós próprios, e sobre nossa percepção de Deus. O problema é que, por causa do pecado, nossa percepção e análise de Deus e da criação são imperfeitas. Portanto, ela requer a obra do Espírito Santo, vencendo os efeitos do pecado, para capacitar-nos a sermos persuadidos de que a Bíblia é, de fato, a Palavra de Deus e que a afirmação que ela faz de si mesma é verdadeira. Em outro sentido, portanto, o argumento da Bíblia como a Palavra de Deus e nossa autoridade suprema não é um típico argumento circular. Esse processo de persuasão é talvez mais comparável a uma espiral na qual o crescente conhecimento da Escritura e o crescente entendimento correto de Deus e da criação tendem a suplementar um ao outro de modo harmonioso, cada um tendendo a confirmar a precisão do outro. Isso não é o mesmo que dizer que o nosso conhecimento do mundo ao redor serve como autoridade maior que a Escritura, mas, ao contrário, que tal conhecimento, se é o conhecimento correto, continua a dar uma certeza maior e melhor, além de uma convicção mais profunda, de que a Bíblia é a autoridade única e verdadeiramente suprema, e que outras afirmações competidoras de autoridade suprema são falsas.
6. Isso não significa ditado de Deus como o único meio de comunicação.
Neste momento é necessária uma palavra de advertência. O fato de que todas as palavras da Escritura são as palavras de Deus não deve nos levar a pensar que Deus ditou cada palavra da Escritura aos autores humanos. Quando dizemos que todas as palavras da Bíblia são as palavras de Deus, estamos falando a respeito do resultado do processo que trouxe a Escritura à existência. A questão do ditado diz respeito ao processo que conduziu ao resultado ou à maneira pela qual Deus agiu a fim de assegurar o resultado que ele pretendia. Deve ser enfatizado que a Bíblia não fala de um único tipo de processo ou de uma única maneira pela qual Deus comunicou aos autores bíblicos o que ele queria que fosse dito. De fato, há indicação de uma grande variedade de processos que Deus usou para conseguir o resultado desejado. Uns poucos exemplos esparsos de ditado são mencionados explicitamente na Escritura. Quando o apóstolo João viu o Senhor ressuscitado na visão na ilha de Patmos, Jesus lhe falou o seguinte: “Ao anjo da igreja em Éfeso escreva” (Ap 2.1); “Ao anjo da igreja em Esmirna escreva” (Ap 2.8); “Ao anjo da igreja em Pérgamo escreva” (Ap 2.12). Esses são exemplos de puro e simples ditado. O Senhor ressuscitado diz a João o que escrever, e João escreve as palavras que ouve de Jesus. Porém, em muitas outras seções da Escritura, tal ditado direto de Deus não é certamente a maneira pela qual as palavras da Escritura vieram à existência. O autor de Hebreus diz que Deus falou aos pais pelos profetas “muitas vezes e de várias maneiras” (Hb 1.1). Do outro lado do espectro do ditado temos, por exemplo, a pesquisa histórica ordinária que Lucas empreendeu para escrever seu evangelho. Ele diz: “Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram entre nós, conforme nos foram transmitidos por aqueles que desde o início foram testemunhas oculares e servos da palavra. Eu mesmo investiguei tudo cuidadosamente, desde o começo, e decidi escrever-te um relato ordenado, ó excelentíssimo Teófilo” (Lc 1.1-3). Esse claramente não é o processo de ditado. Lucas usou o método comum de conversar com testemunhas oculares e obter dados históricos de forma que pudesse escrever sua narrativa precisa da vida e dos ensinos de Jesus. Fez a pesquisa histórica de maneira completa, ouvindo relatos de muitas testemunhas oculares e avaliando sua evidência cuidadosamente. O evangelho que escreveu enfatiza e reflete seu estilo característico de escrever. Entre os dois extremos, do ditado por um lado e da pesquisa histórica ordinária por outro, temos muitas indicações de vários modos pelos quais Deus comunicou-se com os autores humanos da Escritura. Em alguns casos, a Escritura fala de sonhos, visões ou de ouvir a voz do Senhor. Em outros casos, ela fala de homens que estiveram com Jesus, observaram sua vida e ouviram seus ensinos, homens cuja lembrança dessas palavras e ações tornou-se completamente precisa pela operação do Espírito Santo, à medida que ele as trazia à memória deles (Jo 14.26). Ao que parece, muitos métodos diferentes foram usados, mas não é importante que descubramos exatamente quais foram eles em cada caso. Em exemplos em que a personalidade humana e o estilo de escrever do autor estavam proeminentemente envolvidos, como parece ser o caso com a maior parte da Escritura, tudo o que somos capazes de dizer é que a superintendência e a direção providenciais de Deus na vida de cada autor foram de tal ordem que a personalidade e a habilidade deles foram exatamente o que Deus queria que fossem para a tarefa de escrever a Escritura. As origens e o treinamento deles (como a preparação rabínica de Paulo, a de Moisés na casa de Faraó ou o trabalho de Davi como pastor), a capacidade de avaliar eventos no mundo ao redor deles, o acesso que tinham a dados históricos, seu julgamento com relação à exatidão de informações e as circunstâncias individuais quando escreveram foram exatamente o que Deus queria que fossem. Assim, quando eles realmente chegaram a escrever, as palavras eram plenamente as suas próprias palavras, mas também eram plenamente as palavras que Deus queria que eles escrevessem, palavras que Deus também afirmaria serem suas.
Portanto, descrer ou desobedecer a qualquer palavra da Escritura é descrer ou desobedecer a Deus.
A seção anterior argumentou que todas as palavras da Escritura são palavras de Deus. Conseqüentemente, descrer ou desobedecer a qualquer palavra da Escritura é descrer ou desobedecer ao próprio Deus.Assim, Jesus pôde repreender seus discípulos por não crerem nas Escrituras do AT (Lc 24.25: “Como vocês custam a entender e como demoram a crer em tudo o que os profetas falaram!”). Os crentes devem guardar ou obedecer às palavras dos discípulos (Jo 15.20: “... Se obedeceram, à minha palavra, também obedecerão à de vocês”). Os cristãos são encorajados a lembrar-se do “mandamento de nosso Senhor e Salvador que os apóstolos de vocês lhes ensinaram” (2Pe 3.2). Desobedecer aos escritos de Paulo era tornar-se sujeito à disciplina da igreja, como a excomunhão (2Ts 3.14) e a punição espiritual (2Co 13.2,3), incluindo a punição de Deus (esse é o sentido evidente do verbo na voz passiva “será ignorado” em lCo 14.38). Por contraste, Deus se agrada de cada pessoa que “treme” diante da sua palavra (Is 66.2). Ao longo de toda a história da igreja, os maiores pregadores têm sido os que reconheceram que não possuem autoridade vinda de si mesmos; sua tarefa tem sido a explicação das palavras da Escritura e a sua clara aplicação na vida de seus ouvintes. A pregação deles deriva seu poder não da proclamação de suas experiências cristãs ou das experiências de outros, nem de suas opiniões, idéias criativas ou habilidades retóricas, mas das poderosas palavras de Deus. Essencialmente, eles permaneceram no púlpito, apontaram para o texto bíblico e disseram de fato à sua congregação: “Isso é o que esse versículo quer dizer. Você também vê esse significado aqui? Então, você deve crer nele e obedecer a ele de todo o seu coração, porque o próprio Criador e Senhor está dizendo exatamente isso para você hoje!”.
Somente as palavras escritas da Escritura podem dar essa espécie de autoridade à pregação.
Autor: Wayne Grudem Fonte: Teologia Sistemática do Autor; Ed. Vida Nova.
Origem da Bíblia
A Bíblia não é um livro qualquer. A origem dela está em Deus, que falou através de homens separados para registrar sua Palavra. Sabemos que a questão do caráter humano das Escrituras é algo acidental ou periférico: os homens escolhidos por Deus para registrar as Escrituras eram pessoas de carne e osso, que viveram em determinado período histórico enfrentando problemas específicos. Não há lugar para nenhum docetismo: os autores secundários tiveram um papel ativo e passivo. No entanto, devemos também acentuar, e este é o nosso ponto neste texto [1], que o Espírito chamou seus servos, revelou a si mesmo e sua mensagem, dirigiu, inspirou e preservou os registros feitos por esses homens. Como afirmou Gerard Van Groningen:
O Espírito Santo habitou em certos homens, inspirou-os, e assim dirigiu-os que eles, em plena consciência, expressaram-se na sua singular maneira pessoal. O Espírito capacitou homens a conhecer e expressar a verdade de Deus. Ele impediu- os de incluir qualquer coisa que fosse contrária a essa verdade de Deus. Ele também impediu-os de escrever coisa que não eram necessárias. Assim, homens escreveram como homens, mas, ao mesmo tempo, comunicaram a mensagem de Deus, não a do homem [2].
Essa compreensão, que advém das próprias Escrituras, caracteriza distintamente o cristianismo: os profetas não falaram aleatoriamente o que pensavam; antes, “testificaram a verdade de que era a boca do Senhor que falava através deles” [3]. Sobre essa questão Calvino declarou:
Eis aqui o principio que distingue nossa religião de todas as demais, ou seja: sabemos que Deus nos falou e estamos plenamente convencidos de que os profetas não falaram de si próprios, mas que, como órgãos do Espírito Santo, pronunciaram somente aquilo para o qual foram do céu comissionados a declarar. Todos quantos desejam beneficiar-se das Escrituras devem antes aceitar isto como um principio estabelecido, a saber: que a lei e os profetas não são ensinos passados adiante ao bel-prazer dos homens ou produzidos pelas mentes humanas como uma fonte, senão que foram ditados pelo Espírito Santo [4].
Nas Escrituras temos todos os livros que Deus quis que fossem preservados para nossa edificação:
Aquelas [epístolas] que o Senhor quis que fossem indispensáveis à sua Igreja, Ele as consagrou por sua providência para que fossem perenemente lembradas. Saibamos, pois, que o que foi deixado nos é suficiente, e que sua insignificância não acidental; senão que o cânon das Escrituras, o qual se encontra em nosso poder, foi mantido sob controle através do grandioso conselho de Deus [5].
Nota:
[1] Veja, para uma perspectiva mais ampla, Hermisten M. P. Costa, Inspiração e inerrância das Escrituras: uma perspectiva reformada, Casa Editora Presbiteriana (www.cep.org.br )
[2] Revelação messiânica no Velho Testamento, p. 64-65.
[3] João Calvino, As pastorais, p. 262.
[4] As Pastorais, p. 262. E outro lugar Calvino diz que os apóstolos foram “certos e autênticos amanuenses do Espírito Santo” (As institutas, IV.8.9). No entanto, devemos entender que Calvino usa essa expressão não para sustentar o “ditado” divino, mas para demonstrar que os apóstolos não criaram da própria imaginação sua mensagem, antes a receberam diretamente do Espírito. Ou seja, ele se refere ao resultado do registro, não ao processo em si. Entedia que Moisés escreveu os cinco livros da Lei “não somente sob a orientação do Espírito do Deus, mas porque Deus mesmo os tinha sugerido, falando-lhes com palavras de sua própria boca” (Calvin’s Commentaries, vol. III, p. 328).
[5]João Calvino, Efésios, p. 86, Editora Parakletos
Autor: Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
Fonte: Fundamentos da teologia reformada, pg. 42-44, Editora Mundo Cristão.
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